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8 de outubro: Che Guevara, presente!

7 de outubro de 2013
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A foto tirada por Alberto Korda é a mais reproduzida em todos os tempos.

Em 8 de outubro de 1967, Ernesto Che Guevara foi assassinado na Bolívia. Depois de sua morte, ele foi instantaneamente transformado em um símbolo do compromisso e do heroísmo revolucionários. Até hoje, Che vive nos corações dos povos solidários.

Via Síntese Cubana

Ernesto Guevara de la Serna nasceu em 14 de junho de 1928, em Rosário, importante cidade industrial da Argentina, em uma família classe média alta. Seu pai, o arquiteto e engenheiro civil Ernesto Guevara Lynch, era um militante político, tendo participado de vários comitês e organizações de ajuda aos países democráticos. Apoiou a resistência republicana na Guerra Civil Espanhola, nos anos de 1930, participou de campanhas para brecar a propaganda nazista nas Américas na Segunda Guerra Mundial e, mais tarde, fez oposição ao governo de Juan Perón. A mãe, Cella de la Serna, era igualmente ativista, tendo sido presa diversas vezes por sua militância política. Durante a juventude de Che, a casa dos Guevara vivia repleta de republicanos espanhóis e militantes socialistas.

Aos 2 anos, Che Guevara sentiu os primeiros sintomas de asma que o atormentaria ao longo da vida. Para minimizar os efeitos da doença, a família foi para Alta Gracia, perto da Cordilheira dos Andes, à procura de um clima mais saudável. Mais tarde, Ernestito, como era chamado pelos parentes, começou a praticar esportes como natação, futebol, ciclismo e rugby. Ao contrário do que se poderia imaginar, ele não desenvolveu uma personalidade fraca e indolente por causa da doença. A enfermidade tornou-se um desafio que ele aceitou sem nenhuma autocompaixão. Outra coisa curiosa que aconteceria depois: Che foi dispensado do serviço militar argentino por incapacidade em virtude da asma.

Quando Guevara tinha 12 anos, sua família mudou-se para Córdoba, segunda maior cidade da Argentina, e foi viver próxima de uma favela. O menino brincava diariamente com as crianças pobres do lugar, uma atitude pouco comum para um filho de classe média alta. Nessa época, ele começou a pegar gosto pela leitura, pois seus pais tinham cerca de 3 mil livros em casa. Che tomou contato com a poesia, filosofia, história e arqueologia, dentre outros assuntos. Com isso, abriu novos horizontes e quis conhecer novos lugares. A primeira viagem foi uma travessia do território argentino de bicicleta promovida por uma empresa local. Em cada cidade que parava, comprava vários livros e, desde essa época, começou a escrever um diário, hábito que manteve por toda a vida.

Em 1944, quando tinha 17 anos, a família Guevara transferiu-se para a capital Buenos Aires, centro cultural e político da Argentina. Ele havia decidido fazer Medicina, mas continuava atraído por viagens e aventuras. Em dezembro de 1949, ainda não tendo terminado o curso, começou uma longa viagem de motocicleta em direção ao Chile com seu amigo Alberto Granados. A idéia era rodar todo o continente, conhecendo os povos, as condições de vida, a história e a geografia da América Latina. Passaram pela maioria dos países, mas os que marcaram mais Guevara foram a Bolívia, a Venezuela e o Peru. Nessa viagem, Guevara começa a ver a América Latina como uma única entidade econômica e cultural. Granados, recém-formado em Medicina, ficou na Venezuela trabalhando num sanatório para leprosos e Che voltou para a Argentina para completar seu curso.

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Che entre sua mãe, Cella de la Serna, e seu pai, Ernesto Guevara Lynch.

Início da inquietação
Em março de 1953, ele se formou em Medicina com especialização em alergia, mas percebeu que ainda não estava preparado para se tornar um médico. Resolveu voltar para a Bolívia. Em um de seus diários, Che relatou: “Quando comecei meus estudos de Medicina, a maioria de meus ideais revolucionários ainda não existia. Como grande parte das pessoas, eu estava em busca de sucesso […]. Mas, quando comecei a viajar por toda a América, entrei em contato com a pobreza, a fome e a doença […]. Vi a degradação e a repressão. Então comecei a entender que havia outra coisa tão importante quanto ser famoso, que era ajudar essa gente.”

Em La Paz, capital da Bolívia, Guevara teve contato com vários grupos políticos, especialmente exilados argentinos. Um dos novos amigos, Ricardo Rojo, era um advogado argentino que escapara das prisões do regime de Perón. O plano de Guevara era se encontrar com Alberto Granados na Venezuela, mas Rojo o convenceu a acompanhá-lo até a Guatemala, “onde as coisas estão acontecendo”. Em 1950, os guatemaltecos tinham elegido o presidente Jacobo Arbens Guzmán, um esquerdista moderado que prometera dar seqüência ao programa de reformas sociais iniciado em 1944, quando fora deposto o último regime militar. Arbens estava sobre fogo cerrado das elites locais e dos interesses norte-americanos.

Para chegar à Guatemala, Guevara, Rojo e um grupo de argentinos fizeram uma difícil viagem pelo Peru e Equador, de onde pegaram um barco para o Panamá. O transporte foi obtido graças à interferência de um político socialista chileno, Salvador Allende, que 20 anos depois seria presidente de seu país e terminaria assassinado durante um sangrento golpe militar.

Do Panamá, o grupo foi para a Costa Rica, onde vivia uma grande comunidade de exilados latino-americanos, incluindo alguns remanescentes do ataque ao quartel de Moncada em 26 de julho de 1953. Os cubanos garantiram que voltariam a Cuba para derrubar Fulgêncio Batista, mas, de acordo com Rojo, nem ele nem Guevara os levaram muito a sério.

Primeira luta
Em janeiro de 1954, eles chegaram à Guatemala para mergulhar em um universo político conturbado. Foi lá que Guevara conheceu a peruana Hilda Gadea Acosta, com quem se casou mais tarde. Ela daria importante contribuição a sua formação política. Também foi lá que conheceu o cubano Nico Lopez, um dos líderes do ataque a Moncada, e que, no futuro, apresentaria Guevara a Fidel e Raul Castro, no México.

Na Guatemala, o exército invasor norte-americano operava a partir de Honduras, sob o comando da CIA – serviço secreto dos Estados Unidos – e com a aprovação do presidente Dwight Eisenhower. Guevara ficou impressionado com a facilidade com que um governo popular era esmagado. “A última democracia revolucionária da América Latina – a de Jacobo Arbens – caiu como resultado da fria e premeditada agressão conduzida pelos EUA […]. Quando a invasão norte-americana começou, tentei juntar um grupo de jovens como eu para contra-atacar. Na Guatemala era necessário lutar e quase ninguém lutou. Era necessário resistir e quase ninguém resistiu”, escreveu Guevara.

Durante a invasão, Che foi guarda voluntário durante o blecaute, nos momentos em que a cidade estava sendo bombardeada. Ele também pediu para ir para o front, mas não foi autorizado. As exortações de resistência feitas por Guevara foram suficientes para colocar seu nome na lista negra dos golpistas. Avisado pelo embaixador argentino de que sua vida e de sua esposa estavam em perigo, eles se refugiam na embaixada.

As experiências na Guatemala foram importantes para a construção de sua consciência política. Foi lá que Che se autodefine como revolucionário e se convenceu da necessidade da luta armada, de tomar a iniciativa contra o imperialismo. “Quando estava na Guatemala de Arbenz, comecei a tomar nota e pensar sobre quais seriam as responsabilidades de um médico revolucionário. Então, depois que vi a agressão norte-americana, entendi uma coisa fundamental: para ser um médico revolucionário, você primeiro precisa de uma revolução”, escreveu certa vez.

Guevara iria atrás dela, mas, inicialmente, precisaria sair vivo da Guatemala. Recusou a oferta de um salvo-conduto para voltar para a Argentina. Resolveu ir para o México, porque se tratava de um país mais hospitaleiro para os refugiados políticos. Chegando lá com um amigo guatemalteco, os dois viraram fotógrafos de rua para sobreviver. Depois de algum tempo, Guevara foi trabalhar no setor de alergia do Hospital Geral da Cidade do México, ao mesmo tempo que lecionava na Universidade Autônoma do México. Um dia encontrou no hospital o cubano Nico Lopez, que o levou para conhecer um compatriota recém-chegado à capital mexicana: Raul Castro.

Encontro com Fidel
Hilda Gadea relata em uma carta que Che e Raul se tornaram amigos, passando a se encontrar todos os dias. Ela descreve Raul como “um dedicado revolucionário, que era aberto, seguro de si, muito claro nas exposições de suas idéias”. Em julho de 1955, Raul apresenta a Guevara seu irmão mais velho: Fidel Castro. Foi amizade à primeira vista.

Che escreveu como se deu o primeiro encontro: “Encontrei Fidel em uma dessas noites frias da Cidade do México. Lembro que nossa primeira discussão foi sobre política internacional. Algumas horas mais tarde, bem de madrugada, já tinha me decidido que participaria da expedição do Movimento 26 de Julho, que em breve pretendia iniciar uma revolução em Cuba. Depois de minhas experiências pela América Latina e principalmente na Guatemala, era necessário muito pouco para me convencer a me juntar a qualquer revolução contra a tirania. Fidel causou boa impressão em mim. Ele estava absolutamente certo de que iríamos para Cuba. Uma vez lá, nós lutaríamos e que, lutando, venceríamos. Seu otimismo era contagiante. Tínhamos de agir e lutar para a consolidação de nossa posição. Era necessário parar de hesitar e começar a luta real. Para provar ao povo cubano que podia confiar em sua palavra, disse em um de seus famosos discursos: ‘Em 1956, nós devemos ser homens livres ou mártires.’ Este era o anúncio que, antes do fim do ano, ele desembarcaria em algum lugar de Cuba no comando de uma força expedicionária.”

Treinamento e embarque
Guevara passou a se dedicar inteiramente à causa. Sob a orientação de Alberto Bayo, um veterano da Guerra Civil Espanhola, de 63 anos, cerca de 80 homens começaram um treinamento de combate em uma fazenda perto da Cidade do México. Os exercícios de simulação consistiam em táticas de guerrilha, operações de ataque e manobras para confundir os inimigos em montanhas e na selva. O grupo suportava marchas de 15 horas por terrenos difíceis, subindo morros, cruzando rios e abrindo caminho no mato, aprendendo e aperfeiçoando os procedimentos de emboscada e de retirada rápida. Em pouco tempo, Che – apelido dado pelos cubanos, que significa “irmão”, em guarani – se tornaria o aprendiz mais dedicado de Bayo.

Nesse meio tempo, Fidel levantava fundos para conseguir realizar a insurreição. Em julho de 1956, a fazenda foi descoberta e 20 pessoas, entre elas Fidel, Guevara e Bayo, foram presas. Libertados um mês depois, tiveram de agilizar o embarque, pois temiam a pressão da polícia mexicana. Planejaram começar a revolução em novembro de 1956.

Com os fundos arrecadados pelo Movimento 26 de Julho, foi possível comprar o barco Granma – “vovó, em inglês –, que não era dos melhores, armas, munições e suprimentos médicos. Guevara seria o médico da expedição. Em 25 de novembro de 1956, o Granma levantou âncora do porto de Tuxpan, levando a bordo, em seus 17,5 metros de extensão, 82 homens que mudariam a história de Cuba e do mundo. A viagem foi conturbada. Vários homens marearam durante o percurso e Guevara sofreu forte crise de asma.

O plano de Fidel era desembarcar, em 30 de novembro, perto da cidade de Niquero, na província de Oriente, cerca de 650 quilômetros de Havana. A chegada coincidiria com um levante em Santiago de Cuba, capital da província, comandado pelo líder estudantil Frank País. O objetivo era juntar forças com os rebeldes de Santiago, criando um movimento de duas pontas, rural–urbano, para atrair a população para a causa revolucionária. O levante eclodiu na data marcada, mas foi esmagado antes que Fidel e seus homens chegassem à praia, em 2 de dezembro.

Depois de sete dias no mar, o exército revolucionário desembarcou, mas não no local previsto onde estariam os suprimentos. Estavam a 16 quilômetros ao Sul, nos mangues da praia Colorado. O Granma encalhou na areia e logo foi descoberto pela Guarda Costeira. Os rebeldes precisaram nadar até a praia, perdendo vários equipamentos importantes, e tiveram que andar horas pelo terreno pantanoso até encontrar terra firme.

Guevara descreveu essa passagem em seu diário Reminiscências da guerra revolucionária da seguinte forma: “Nós encontramos terra firme, nos perdemos como sombras ou fantasmas, marchando em resposta a algum obscuro impulso psíquico. Havíamos enfrentado sete dias de constante fome e enfermidades durante a travessia do mar e nos defrontamos com três dias ainda mais terríveis em terra. Exatamente dez dias depois de nossa partida do México, nas primeiras horas do dia 5 de dezembro, após uma noite de caminhada constantemente interrompida pela fadiga e por períodos de descanso, encontramos a área paradoxalmente conhecida como Alegria de Pío.”

Os rebeldes de Fidel estavam sendo cercados pelo Exército cubano nos canaviais de Alegria de Pío. Os aviões, que circulavam o local, começaram a abrir fogo. Aconteceu uma correria desenfreada em busca de abrigo seguro. Che atendia alguns companheiros que estavam com ferimentos leves, quando um homem, querendo se refugiar, deixou cair seu carregador de munição. Guevara estava com a sacola de medicamentos cheia, seria impossível carregar as duas coisas por causa do peso. Foi aí que ele tomou a decisão de ser um revolucionário: pegou a munição e largou os medicamentos para trás, correndo para o meio do canavial.

Depois de muito andar para não serem capturados pela Guarda Rural de Batista, foram contabilizadas as perdas. Dos 82 homens que desembarcaram do Granma, apenas 17 sobreviveram. Nico Lopez havia morrido e Che teve ferimentos leves no peito e no pescoço.

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Em Sierra Maestra, Che era o responsável pela transmissão da Rádio Rebelde.

Destino: Sierra Maestra
Os rebeldes planejaram começar a revolução por Sierra Maestra, uma alta cadeia montanhosa de Cuba. A região era habitada por camponeses pobres e analfabetos, que lavravam pequenas roças para subsistência. As terras pertenciam a latifundiários, que pegavam uma parte de seus lucros. Em 1956, era praticamente impossível que a tropa regular de Batista conseguisse chegar ao local, pois era um lugar selvagem e não havia caminhos pela mata. Os treinamentos no México seriam úteis para os revolucionários nessa hora.

Em janeiro de 1957, Fidel e seu exército, agora com 20 homens, decidiram realizar um ataque para mostrar que o Movimento 26 de Julho estava vivo e ativo. Atacaram um pequeno posto da Guarda Rural na foz do rio La Plata. Conseguem capturar algumas armas e munições. Em fevereiro, Herbert Matthews, repórter do New York Times, foi à Sierra Maestra e fez uma longa entrevista com Fidel. Quando a reportagem saiu no jornal, o movimento ganhou notoriedade internacional, despertou simpatias e, principalmente, legitimidade. O governo de Fulgêncio Batista foi forçado a reconhecer que havia um exército rebelde em atividade dentro de Cuba.

Os revolucionários impressionavam as pessoas por seguirem um novo código de conduta bélica. As tropas regulares de Batista torturavam e executavam seus prisioneiros, além de cometer atrocidades contra civis. Já os rebeldes de Sierra Maestra tinham como norma liberar todos os soldados governamentais e jamais maltratar as pessoas da população local. Ao assumir princípios humanistas, os revolucionários conquistaram a confiança dos camponeses. Eles se mantinham firmes aos ensinamentos de José Martí, o herói nacional.

Ao longo de 1957, aumentava lentamente o número de rebeldes. Nesse mesmo ano, Fidel concede a Che a patente de comandante, posto que até então apenas ele próprio possuía, e o colocou na liderança da Segunda Coluna do Exército Rebelde. Depois de quase um ano em Sierra Maestra, os revolucionários perceberam que a semente estava germinando. Em toda parte de Cuba, surgiam protestos contra o governo. As forças de Fidel, agora com cerca de 300 combatentes, estavam bem organizadas. Ele e Che montaram fábrica de munição, escolas, clínicas, cozinhas coletivas, oficinas de trabalho, um jornal e uma estação de rádio na região (a Rádio Rebelde). Os camponeses receberam terras e se sentiam livres das arbitrariedades cometidas pela Guarda Rural.

Em abril de 1958, as forças anti-Batista no campo e nas cidades convocaram uma greve geral imaginando que o ditador fosse renunciar, mas o movimento fracassou. Em maio, o governo colocou 10 mil homens em Sierra Maestra, apoiados por tanques e aviões. A ofensiva durou quase três meses, porém o exército de Batista, desorganizado e não sabendo lutar nas montanhas, limitou-se a bombardear vilas e povoados, matando dezenas de civis.

Batalha final
Em agosto, as tropas regulares se retiraram do campo de batalha. Sierra Maestra estava nas mãos dos revolucionários. O comandante-em-chefe agora planejava sua ofensiva final para tomar o controle das grandes cidades. Fidel e Raul marcharam com 200 homens para Santiago de Cuba, onde receberiam o reforço de outros 600 rebeldes para tentar ocupar a cidade. Enquanto isso, Che Guevara, com 148 homens, atravessava a província de Las Villas, em direção às montanhas Escambray e à cidade de Santa Clara. Camilo Cienfuegos comandava uma coluna de 82 homens, movendo-se paralelamente às forças de Che. O alvo dele era Havana.

Em dezembro, Guevara recebeu a missão de tomar toda a província de Las Villas, cortando a ilha em duas partes. Em questão de dias, com brilhantes manobras táticas, ele conquistou toda a província, exceto a capital, Santa Clara. Defendida por 2 mil soldados, a cidade contava com apoio aéreo. Guevara tinha apenas 200 homens. Os arredores de Santa Clara se renderam rapidamente com as tropas governamentais evitando o combate, mas o controle do centro da cidade custou três dias de luta e convencimento dos soldados governistas. Com a tomada de Santa Clara em 31 de dezembro de 1958, não havia mais nenhum obstáculo entre os rebeldes e Havana.

Santiago de Cuba continuava cercada pelas forças de Fidel e Raul. O comandante militar da cidade telefonou para Batista dizendo que não poderia manter a cidade por muito tempo. Sabendo que seu exército estava aniquilado e nada mais poderia fazer, às 3 horas da madrugada do dia 1º de janeiro de 1959, o ditador, juntamente com alguns comparsas, fugiu de avião para a República Dominicana com medo de ser morto. Prudente, Fulgêncio Batista já havia transferido para o exterior uma fortuna estima em US$ 800 milhões, amealhada em anos de saque do Tesouro Nacional.

Quando Fidel soube da fuga de Batista, preparou-se para marchar sobre Santiago. O comandante militar da cidade, no entanto, rendeu-se sem oferecer resistência e Fidel entrou pacificamente na cidade. De Santiago, Fidel irradiou um apelo ao povo de Havana, conclamando-o a evitar violência e manter-se vigilante pela justiça. Prometeu que as forças rebeldes adentrariam as cidades de Cuba para restabelecer a ordem e impedir a contra-revolução. “A ditadura desmoronou”, disse ele, “mas isso não significa que a revolução tenha triunfado. Revolução, sim! Golpe militar, não!”

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Em 2 de janeiro de 1959, os revolucionários entraram em Havana e assumiram o controle da cidade.

Fidel pediu que Guevara e Cienfuegos seguissem para Havana. Em 2 de janeiro de 1959, eles entraram na cidade e assumiram o controle das instalações militares para evitar qualquer reação do Exército. No mesmo dia, Fidel começou sua lendária travessia de 800 quilômetros por toda extensão de Cuba, fazendo discursos e entusiasmando a multidão. Ele chegou em Havana em 8 de janeiro. A luta militar havia sido ganha. Agora, os revolucionários tinham pela frente o igualmente espinhoso trabalho de criar uma nova sociedade.

Em suas reflexões sobre a vitória final dos rebeldes, Che escreveu o seguinte: “A ditadura de Batista criara o necessário fermento, com sua política de opressão das massas e manutenção de um regime de privilégios. Privilégios para os servos do regime, para latifundiários parasitas e comerciantes. Privilégios para os monopólios estrangeiros. Um vez que o conflito começou, as medidas repressivas do governo e sua brutalidade, em vez de diminuírem a resistência popular, fortaleceram-na. A desmoralização e a falta de vergonha da casta militar facilitaram a tarefa. A rudeza das montanhas em Oriente e a incapacidade tática do inimigo também fizeram sua parte. A guerra, contudo, foi vencida pelo povo, por meio da ação de sua vanguarda armada (o exército rebelde), cujas armas básicas eram seu moral e sua disciplina.”

Dever cumprido
Depois de seu trabalho como médico e comandante das tropas rebeldes, Che foi proclamado “cidadão cubano de nascimento” e, no governo revolucionário, assumiu o posto principal do Banco Nacional de Cuba. Em seguida, foi para o Ministério da Indústria, onde desenvolveu uma política econômica voltada à diversificação da agricultura e à industrialização a fim de reduzir a dependência externa. Guevara também foi embaixador cubano, tendo visitado vários países, inclusive o Brasil, em 1960, onde foi condecorado pelo presidente Jânio Quadros, ansioso para demonstrar que o País tinha uma política externa independente.

Che ficou no cargo até abril de 1965, quando saiu de Cuba para levar a Revolução para outros países. Além disso, tinha suas dúvidas quanto à excessiva aproximação cubana com os soviéticos, posição que deixou bem clara nos encontros nos quais participou na época. Queria voltar a voar, não se prender a uma revolução. Já tinha dito a Fidel, antes de entrar para o exército rebelde cubano, que “vou retomar minha liberdade de revolucionário depois do triunfo da Revolução Cubana”. Deixou Cuba e uma carta a Fidel, que dizia num trecho o seguinte: “Sinto que cumpri a parte de meu dever que me atava à Revolução Cubana em seu território e me despeço de ti, dos companheiros, de teu povo, que já é meu. Faço formal a renúncia de meus cargos na direção do partido, de meu posto de ministro, de meu posto de comandante, de minha condição de cubano… Outras terras do mundo reclamam o concurso de meus modestos esforços… Até a vitória, sempre. Pátria ou Morte!” Assim foi para o Congo, onde tentou organizar uma guerrilha, que acabou sendo frustrada. Retornou em segredo para Havana e dali partiu, em outubro de 1966, para as selvas bolivianas, levando alguns guerrilheiros cubanos para encontrar outros homens na Bolívia, de onde empreenderiam uma guerrilha similar à que saiu vitoriosa em Cuba.

Mesmo com cerca de 50 homens em território boliviano, as tropas de Che venceram algumas lutas contra os inimigos. Mas, isolados nas montanhas da Bolívia, Che Guevara e seus companheiros foram denunciados ao Exército boliviano. Em 8 de outubro de 1967, eles foram encurralados num despinhadeiro e poucos escaparam. Che, ferido na perna, ficou preso na cidade de La Higuera. O governo boliviano estava diante de um dilema: executar Guevara ou levá-lo a julgamento. Esta última hipótese foi descartada imediatamente por René Barrientos, presidente boliviano na época. O banco dos réus exporia La Paz a uma campanha internacional por sua libertação.

Guevara foi interrogado por agentes da CIA e da inteligência boliviana. Em seguida, foi destacado um oficial para executá-lo. O soldado disparou várias vezes. Che estava morto.

Poucas horas depois, vários repórteres e fotógrafos chegaram em La Higuera e foram levados para uma lavanderia onde o corpo de Guevara fora colocado em exposição. A notícia se espalhou pelo mundo, mas, durante dias, houve uma discussão internacional sobre a veracidade da morte do guerrilheiro. Todas as especulações terminaram em 15 de outubro, quando Fidel Castro anunciou que realmente Guevara tinha sido capturado e executado na Bolívia.

Em seu discurso, profundamente emocionado, Fidel pronunciou o seguinte: “Raramente pode-se dizer de um homem com maior justiça e com maior precisão o que vou falar sobre Che: ele foi um exemplo puro de virtudes revolucionárias; ele foi um ser humano extraordinário; um homem de extraordinária sensibilidade. Che era um homem de total integridade, um homem de supremo senso de honra, de absoluta sinceridade. Um homem de hábitos estóicos e espartanos, cuja conduta nenhuma mácula pode ser encontrada. Ele constituía, dentro de várias virtudes, o que podemos chamar de o verdadeiro modelo revolucionário.”

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Che capturado na Bolívia.

Os restos mortais de Guevara, depois de ficarem 30 anos enterrados num cemitério clandestino na Bolívia, foram identificados e exumados em julho de 1997. Atualmente, eles se encontram enterrados n Mausoléu Ernesto Che Guevara, na cidade de Santa Clara, em Cuba.

Mesmo se não levarmos em conta seus sucessos e frustrações durante toda sua vida, Ernesto Che Guevara, por si só, serviu como um símbolo da dedicação revolucionária, cujas ações foram sempre consistentes e em harmonia com seus ideais morais. Ele morreu lutando por esses ideais, mas continua vivo nos corações de todos os povos solidários.

TJMG: Processo que incrimina governantes mineiros desaparece

15 de julho de 2013
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Anastasia e Aécio: Os processos contra eles sumiram.

Certidão do TJMG atesta que processo contendo provas de corrupção, assassinato e suborno que incriminam o grupo de Aécio Neves desapareceu.

Marco Aurélio Carone, via Novo Jornal

Só mesmo por meio da interferência de organismos internacionais a moralidade e a legalidade poderão ser restauradas em Minas Gerais. A princípio imaginava-se que uma intervenção federal seria suficiente para pôr fim as constantes quebras das garantias civis e do Estado Democrático de Direito, porém sabe-se agora que a organização criminosa que opera em Minas Gerais tem apoio e até mesmo participação de integrantes da máquina pública federal.

Hoje sem medo de cometer injustiça, pode-se afirmar que os diversos poderes do Estado de Minas Gerais encontram-se reféns de um grupo criminoso que ameaça, intimida, frauda, sequestra e mata sob a proteção das instituições do governo do Estado. A Polícia, o Ministério Público e a Justiça que deveriam combater a organização criminosa estão imobilizadas devido o comprometimento de seus dirigentes.

Não se pode isentar de culpa nem mesmo o governador, Antônio Anastasia, uma vez que é de seu total conhecimento o que vem ocorrendo no Estado. É bem verdade que Anastasia herdou de Aécio o esquema criminoso já montado, entretanto a permanência do mesmo assim como de seus integrantes junto à máquina pública estatal indiscutivelmente depende de sua cumplicidade.

Como já narrado em outras reportagens, Minas Gerais se transformou em um Estado perigoso de se viver, e principalmente para constituir família e criar filhos, em função da inversão de valores após a eleição de Aécio Neves em 2002. Diante de seus vícios e hábitos, sua ida para o Poder representou a captura das instituições do governo por seus companheiros de vício e práticas.

Literalmente, a droga, a corrupção e a pederastia, (não confundir com homossexualismo, opção sexual) passou a ser quesito primordial para escolha de seus assessores e auxiliares. Evidente que a imprensa pouco falou a este respeito devido à censura imposta, contudo os que não eram adeptos do vício e das práticas de Aécio foram afastados do círculo do Poder.

Até mesmo no interior do Estado, tal fato ocorreu através da eleição de prefeitos e vereadores adeptos do que se convencionou chamar de “modelo Aécio”.

Por justiça, é necessário destacar que a grande maioria dos integrantes do TJMG e do MPMG vem lutando contra este estado de desmanche institucional, porém, desembargadores, juízes, promotores e procuradores são impotentes diante do comprometimento de seus dirigentes com o “modelo Aécio”.

Durante seis anos tramitou no TJMG o processo nº 0024.06.001.850-4 oriundo do inquérito nº 1027539, colhendo provas e depoimentos de integrantes e vítimas do esquema criminoso montado no Poder Judiciário, no Ministério Público e na Polícia Civil do Estado de Minas Gerais, até que o mesmo foi noticiado por Novojornal.

A partir deste momento o processo passou a tirar o sono de Aécio Neves, pois as investigações fatalmente chegariam a ele devido seu envolvimento em fatos apurados e citados nas investigações e da comprovada participação de seus principais assessores e amigos no esquema criminoso.

Além de Aécio, grandes empresários, advogados e alguns integrantes dos Poderes, Executivo, Legislativo, Judiciário do Ministério Público e da Polícia Civil de Minas Gerais também passaram a temer o processo.

Após a instauração do inquérito nº 3530 no STF em Brasília devido ao atentado contra Nilton Monteiro atribuído a Césio Soares Andrade, Eduardo Azeredo e Walfrido dos Mares Guia o processo anteriormente citado passou a ser cobrado insistentemente pela Polícia Federal, pelo STF e CNJ e ninguém o encontrava.

Segundo seus colegas, incansável foi à busca pelo advogado Dino Miraglia, nas diversas varas por onde passou o processo para encontrá-lo e comprovar serem verdadeiros os documentos e fatos narrados por Milton Monteiro, que embora não condenado, se encontra preso por prazo “indeterminado” sob a acusação de falsificação de documentos. Diante da insistência do Dr. Dino o TJMG foi obrigado a certificar que o processo havia desaparecido.

Consta da representação do Dr. Dino ao CNJ que o delegado Nabak vem avocando todas as investigações que tenham relação com o grupo criminoso a exemplo dos inquéritos que estavam sob sua presidência quando de sua transferência do DEOESP e de ser o responsável pelo desaparecimento do processo.

A atuação do delegado é igualmente investigada em vários procedimentos instaurados pelo Ministério Público Mineiro e através da Ação Penal do processo nº 0024.13.003.776-6 por ter ameaçado de morte o advogado de Monteiro, Dr. Dino Miraglia.

Enquanto isto, Nilton Monteiro permanece como preso político do PSDB mineiro, tendo em vista ter entregado a “Lista de Furnas”, a “Lista do Mourão”, AP 2280 ao STF e por ser a principal testemunha de acusação no processo do Mensalão tucano. Segundo versão corrente no meio jurídico, dificilmente o mesmo sairá vivo da prisão, principalmente, após o atentado conforme apurado no inquérito 3530 do STF.

Novojornal teve acesso à representação do Advogado Dino Miraglia e de Milton Monteiro ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ, acompanhada das principais peças constantes do processo desaparecido. Tais peças são disponibilizadas com exclusividade para nossos leitores. Trata-se de documentos que chocam qualquer cidadão comum, pois mostram as vísceras do Poder construído por Aécio Neves e seu grupo.

Importante: Todos os documentos apresentados nesta reportagem estão autenticados e a disposição do TJMG com o advogado Dr. Dino Miraglia, caso o Tribunal queira restaurar o processo desaparecido.

Hugo Chavez sabia que os serviços secretos dos EUA estavam atrás dele

5 de abril de 2013

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Nil Nikandrov, via Information Clearing House e lido no Brasil de Fato

Hugo Chavez não era o homem obcecado com a ideia de estar sendo seguido e observado, como a propaganda tentou mostrar. Ele era um político que enfrentou a realidade e sabia como era odiado por Washington e pela oposição dos Estados Unidos em todas as questões políticas ou econômicas. Ele tratou com seriedade as ameaças vindas dos presidentes Bush e Obama, do Departamento de Estado e do Pentágono. Ele sabia muito bem que os serviços especiais do Ocidente tinham um arsenal diversificado de meios para fisicamente liquidar pessoas.

Fidel Castro compartilhou essa experiência, houve mais de 600 tentativas de assassinato contra ele cometidas pela CIA e a inteligência militar dos EUA. Até mesmo um número limitado de documentos secretos tornados públicos recentemente provam que não havia limite para os serviços especiais, que usaram inclusive atiradores de elite e veneno para cumprir uma tarefa.

Fidel o acusou de ser descuidado e recomendou que ele prestasse mais atenção a seu redor. Ele disse que haviam surgido novas tecnologias e não era seguro aceitar comida que fosse oferecida. Ele disse ao Chavez: “Chavez se cuide. Essa gente [os estadunidenses] desenvolveu tecnologias. Você é muito descuidado. Cuidado com o que você come, o que lhe oferecem para comer… uma pequena agulha e eles te injetam sabe o quê.”

O presidente e os serviços de segurança estavam preocupados com a propaganda ocidental maciça que demonizava Chavez, apresentando-o como uma ameaça ao “mundo livre”, religião, propriedade privada e valores tradicionais da família. Algumas pessoas, quando sujeitas a efeitos emocionais sistemáticos, se tornam propensas a cometer atos terroristas. Segundo estatísticas, houve dezenas de tentativas de assassinato contra Chavez cometidas por pessoas dementes que vinham armados participar de reuniões. Alguns agentes da lei foram vítimas de tal impacto. Em fevereiro de 2008, alguns oficiais da Guarda Nacional foram presos acusados de participar de uma tentativa de assassinato. Em setembro de 2008, um grupo de militares foi detido enquanto preparava um ataque com o uso de lançadores de granadas contra o Força Aérea 1.

Os serviços especiais dos EUA fizeram as primeiras tentativas para acabar de vez com o Chavez durante a campanha presidencial de 1998. Um grupo de pistoleiros profissionais, contratados pela CIA na Colômbia e na Republica Dominicana, seguiu o então candidato durante sua campanha em lugares isolados na Venezuela. Atiradores de elite deitados em emboscadas foram vistos próximos a locais onde o presidente fez comícios. Depois disso, a caçada a terroristas que tentavam cumprir a missão de matar Chavez se tornou uma rotina diária dos serviços de segurança bolivarianos. Em maio de 2009, Laurent Bouquet, um francês, e três dominicanos foram detidos. Em seu apartamento foram encontrados rifles, metralhadoras, granadas e um quilo de explosivos. Segundo o ministro de Assuntos Internos da Venezuela, Tarek El-Aissami, o grupo havia sido encarregado do assassinado de Chavez. Bouquet era um militar da ativa das forças armadas de um dos países europeus. Segundo vazamentos na internet, os serviços dos EUA organizaram o envio do oficial da inteligência militar francesa para a Venezuela.

A vitória de Chavez nas eleições presidenciais de 2012 era inevitável. No período entre 2009 e início de 2010, a missão de eliminar Chavez estava na lista de prioridades da comunidade de inteligência dos EUA. Os métodos tradicionais, por exemplo, assassinatos cometidos por pessoas dementes, queda de aeronaves, e afins, foram descartados. O uso de venenos conhecidos também estava fora de cogitação. Houve muitos casos de líderes latino-americanos que foram neutralizados dessa maneira. Uma bala, um acidente de avião ou veneno iriam indicar quem estava por detrás da ação.

Portanto, a contaminação que levou a uma doença incurável foi escolhida como a forma de se fazer o trabalho. Era tecnicamente possível. José Vicente Rangel escreveu no artigo “Câncer inoculado”, publicado em 17/3/2013 na edição do jornal Últimas Notícias, que experimentos para obtenção de crescimento canceroso haviam sido conduzidos nos EUA por pelo menos 40 anos. Os laboratórios situados em Fort Detrick, Maryland, realizam pesquisas clandestinas sobre armas biológicas; o Instituto Nacional do Câncer está situado lá também. O Laboratório Nacional de Pesquisa do Câncer Frederick, que funciona sob a supervisão da CIA e do Pentágono, é um exemplo disso. Como fontes da internet relatam, um programa especial do vírus do câncer foi desenvolvido com sucesso lá. O vírus do câncer entra no sangue e no sistema linfático. O acesso ao DNA faz com que o vírus seja personalizado e mais eficaz. Isso nos remete a um documento publicado no WikiLeaks, com instruções do Departamento de Estado para a embaixada dos EUA no Paraguai para furtivamente obter DNA dos quatro candidatos à presidência. O documento menciona os quatro candidatos, mas o real interesse estava no candidato de esquerda Fernando Lugo, um aliado em potencial de Hugo Chavez, que apoiou a ideia da criação de “um eixo de estados populistas” no continente. Dois anos após a eleição, Lugo adoeceu com câncer linfático, uma forma mais branda do que a que o falecido Chavez desenvolveu. Ele teve de ir ao Brasil para tratamento, enquanto o vice-presidente Federico Franco, o filho favorito da CIA e do Departamento de Estado, governou o país.

A epidemia de câncer na América Latina se espalhou acometendo os presidentes de esquerda, fato que não poderia passar desapercebido. Fernando Lugo, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff, Cristina Fernandez de Kirchner foram diagnosticados. Eles foram marcados com a Mancha Negra, um aviso de que não é seguro se opor aos interesses dos Estados Unidos no cenário internacional. A morte de Hugo Chavez demonstrou as implicações que podem se seguir. Para quem não está convencido de que os EUA estão envolvidos em uma limpeza, tentando se livrar de líderes hostis, basta lembrar o destino de muitos políticos influentes em muitas regiões de importância estratégica. As ações punitivas ainda não acabaram. Eles golpearam contra a Síria; e o Irã e Paquistão são os próximos. Depois será a vez dos membros do Brics, os EUA farão todo o possível para evitar que se tornem uma força internacional poderosa do século 21.

Chavez advertiu sobre isso. Ele sempre deu nome aos bois. Para ele, os Estados Unidos eram “um império do mal”, um agressor, um Estado terrorista constantemente travando guerras para conquistar territórios ricos em recursos. Ele conclamou seus colegas na América Latina e Caribe para a criação de alianças com “força” para conter a política dos EUA. Ele pagou caro por isso. A liderança da Venezuela e os principais líderes da América Latina, que mantinham relações amigáveis com Chavez, não acreditam que ele tenha morrido por causas naturais. Os palpites de que tenha sido uma operação especial são expressos mais e mais frequentemente.

No dia da morte de Chavez, o vice-presidente da Venezuela, Nicolas Maduro, disse em um discurso à nação que “não há dúvida de que a saúde do comandante Chavez foi atacada pelo inimigo”. Ele disse que havia bases sólidas para o lançamento de uma investigação. Segundo ele, “não há nem uma única dúvida e, no momento adequado, vamos convocar uma junta médica para confirmar que Chavez foi atacado”. Ele ligou o caso de Chavez ao caso do líder da Frente de Libertação da Palestina, Yasser Arafat, cuja morte, disse Maduro, foi causada por envenenamento pelos israelenses. De acordo com resultados de pesquisas de laboratório realizadas no Instituto de Radiophysique, em Lausanne, Suíça, Arafat foi envenenado por polônio-210. Nicolas Maduro disse que foram coletadas amostras de tecido de Chavez para se fazer um diagnóstico. Sem revelar o nome do paciente, as amostras foram enviadas para o Brasil, China, Rússia e até mesmo aos EUA. A resposta foi a mesma, as células cancerígenas têm características especiais, como intensidade incomum de propagação e multiplicação nunca antes encontrados na prática médica.

De acordo com Maduro, uma comissão especial de investigação será encarregada de rever de forma abrangente os detalhes da morte de Chavez após a eleição em 14 de abril. Foi noticiado que o governo bolivariano pretende pagar um milhão de dólares em recompensa para aqueles que vão ajudar a tornar precisas as circunstâncias e a identificar quem cometeu o crime – o assassinato do presidente Chavez.

Tradução: Ana Amorim

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Depoimentos de ex-militantes reforçam sadismo de torturadores na ditadura

26 de março de 2013
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Familiares e colegas depuseram sobre a morte de Virgílio Gomes da Silva: o militante foi assassinado brutalmente.

Detalhes sobre o assassinato do comandante Jonas, da Ação Libertadora Nacional, foram revelados na semana passada em audiência da Comissão da Verdade de São Paulo.

Júlia Rabahie, via Rede Brasil Atual

Novos depoimentos de ex-militantes reforçam a dose de sadismo dos torturadores de presos políticos no final da década de 1960, além de trazer à tona detalhes sobre a morte de Virgílio Gomes da Silva, o comandante Jonas, em setembro de 1969. Os militantes, assim como Virgílio, faziam parte da Ação Libertadora Nacional (ALN), uma das principais organizações guerrilheiras de combate à ditadura brasileira (1964-1985).

Antônio Carlos Fon, Celso Horta e Manuel Cirillo participaram da audiência pública da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva, na Assembleia Legislativa, para depor sobre a morte de comandante Jonas, torturado em um dos porões da ditadura, a Operação Bandeirantes (Oban). A Oban se tornaria depois o Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) de São Paulo.

“O capitão Albernaz era o mais violento e o mais doente de todos eles. Ele simbolizava muita coisa, andava com um pedaço de viga de madeira na mão, e quando passava nos corredores ia batendo nos presos. Não precisava de sala ou interrogatório para torturar. Ele era o exemplo do diabo”, disse Horta ao comentar a atuação do capitão do Exército Benoni de Arruda Albernaz na repressão aos presos da Oban. “Aquilo era uma casa de horror e de gritos”, completou.

Comandante Jonas era dirigente da ALN e foi um dos comandantes do sequestro do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick, no dia 4 de setembro de 1969. Poucos dias depois do fim da operação, quando pretendia mudar-se para Cuba com a família, Jonas foi preso, torturado e assassinado, segundo relatos.

Os depoimentos dos companheiros de militância de Virgílio à Comissão da Verdade indicam que sua morte ocorreu no dia 29 de setembro do mesmo ano, dia em que foi preso. O jornalista e companheiro de Virgílio da ALN, Antônio Carlos Fon, declarou ter certeza sobre os responsáveis pela morte do amigo. “Major Inocêncio de Fabrício Beltrão, capitão Benone de Arruda Albernaz, sargento Paulo Bordini e capitão Maurício Lopes Lima assassinaram Virgílio Gomes da Silva, sob tortura brutal. Afirmo aqui e afirmo em juízo se for necessário.”

“Neste dia tínhamos marcado um ponto e percebi logo que havia repressão ali. Nem cheguei a atravessar a rua. Mas me localizaram, e quando me dei conta estava dentro de um Fusca, os soldados com os pés em cima de mim. Fui desembarcar na Operação Bandeirantes”, contou Celso Horta, que, à época, era estudante e militava na ALN desde 1968. “Sofri choques elétricos e assim que os torturadores se retiraram vi a chegada do Virgílio. Ele devolvia os chutes e gritava ‘vocês estão matando um brasileiro, um patriota’.” Esta foi a última vez que Horta viu Jonas vivo.

Apesar de afirmar certeza sobre sua data de prisão – dia 30 de setembro de 1969 (um dia após a prisão de Virgílio) – os documentos de prisão de Manuel Cirillo indicam que sua captura foi feita antes desta data, no dia 16 do mesmo mês. “Isso já é a primeira coisa a ser investigada pela comissão.”

“Toque vermelho”

Cirillo estava hospedado em uma casa em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, quando foi preso, junto com a esposa de Virgílio, Ilda Gomes da Silva, e os quatro filhos do casal: Virgílio, Vladimir, Gregório e Maria Isabel – que tinha apenas quatro meses de idade. “Esperávamos documentos falsos para ir para o exterior. Quando acordei, na manhã do dia 30, havia um cidadão com um pé no meu peito e um fuzil na minha cara. Os espancamentos começaram ali mesmo, na frente das crianças”, contou Cirillo.

O militante contou que, logo ao chegar no prédio da Oban, foi levado para a sala de tortura. “O que mais impressionou no pau de arara foi o sangue que havia ali, devia haver pedaços de massa encefálica também”, disse, emocionado. De acordo com ele, enquanto era torturado, os torturadores diziam, repetidamente e em tom de escárnio “matamos um brasileiro aqui, mas que tinha um toquezinho de vermelho”. “Debaixo das porradas que eu sofria, contaram que mataram um ‘brasileiro’ na véspera, isso ficou na minha cabeça”, contou.

Foi apenas em 2004 que a ficha do atestado de óbito de Virgílio foi localizada no Instituto Médico Legal (IML) de São Paulo. “Mais de 30 anos depois, o atestado de óbito de Virgílio é achado, e traz as informações de que vestia uma camiseta amarela, um calção verde e meias vermelhas. Um brasileiro com um toque de vermelho.”

O atestado também indicava que o corpo do militante havia sido sepultado no Cemitério da Vila Formosa, o maior da América Latina, na zona leste paulistana. No fim de 2010, atendendo aos pedidos da família, do Sindicato dos Químicos – do qual era militante – e do Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo, o Ministério Público Federal conseguiu acordo para que se desse início aos trabalhos de escavação no cemitério.

A operação, envolvendo a Polícia Federal, o Instituto Médico Legal e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, foi encerrada em março de 2011 com a retirada de várias ossadas que passaram por análises de laboratório. O cemitério, a partir da década de 1970, foi fortemente descaracterizado, teve suas ruas alargadas e árvores plantadas, tornando a localização dos corpos praticamente impossível.

Ilda Gomes da Silva e dois de seus filhos estavam presentes na audiência: Virgílio – Virgilinho, como é chamado – e Maria Isabel. Em depoimento emocionado, Virgilinho contou sobre o período em que ele e o irmão ficaram separados da mãe, quando ela foi presa. Dona Ilda ficou nove meses na prisão. Neste período, as crianças ficaram no Juizado de Menores por dois meses.

“Levavam a gente para passear e mostrar casas, nos oferecendo para adoção. Diziam que nossos pais eram bandidos. Depois nossas tias conseguiram nos tirar de lá, fomos cada um morar com uma delas.” Depois da soltura de dona Ilda, ela e os filhos foram para Cuba, em 1973, da onde só retornaram ao Brasil depois de 21 anos, em 1994. “Em Cuba, eu vi o sonho dos que lutavam contra a ditadura no Brasil”, disse o filho do dirigente morto.

Ele também agradeceu a presença dos militantes da ALN na audiência, ressaltando a importância de seu papel para o resgate à memória e à verdade. “Somos privilegiados de estar aqui com pessoas que fizeram parte da história do Brasil, que abdicaram de seus sonhos para levantar sua voz na Justiça contra aqueles que, pela força, achavam que podiam dominar.” Ele também destacou o trabalho das comissões da verdade pelo País. “Já vivi vários momentos históricos e neste momento vivo outro, de resgate da justiça.”

Ampla, geral e irrestrita

O deputado Adriano Diogo (PT), presidente da comissão, e os ex-militantes da ALN defenderam uma revisão da Lei da Anistia, de 1979, que garante anistia política aos militantes de esquerda e também aos agentes da repressão do Estado. “Aquela gente tomou de assalto o Estado brasileiro. Todas as instituições foram tomadas de assalto, esta lei tem de ser revista, foi votada por um Congresso cassado, porque o parlamento também foi tomado”, disse Cirillo.

A lei garante anistia àqueles que cometeram “crimes políticos ou conexos com estes”. Cirillo contesta o significado dado, pela lei, aos crimes conexos. “Não deveriam ser crimes entendidos como aqueles praticados pelos que estavam no poder, mas sim como a criação de condições para os guerrilheiros fugirem de prisões, coisas do tipo.”

Atuação

Virgílio Gomes da Silva nasceu na cidade de Santa Cruz, no Rio Grande do Norte, em 1933. Em 1957, já em São Paulo, começou a trabalhar como operário na empresa Nitroquímica. No mesmo ano, ingressou no PCB e passou a atuar no Sindicato dos Químicos e Farmacêuticos de São Paulo. Em 1964, após o golpe, foi preso por sua atuação como sindicalista e após alguns meses ficou no Uruguai, durante três meses. Em 1967 entrou para a ALN e foi para Cuba fazer treinamento de guerrilha, onde ficou até 1968.

Os depoimentos dos colegas e familiares lembraram Virgílio como um “grande estrategista”. “Virgílio sempre teve a cabeça voltada para o social, antes de mais nada, apesar de ser nosso comandante militar”, disse Celso Horta.

Mauro Santayana: A estranha morte de Jango

24 de março de 2013

Jango06Mauro Santayana em seu blog

A família de João Goulart autorizou a exumação de seus ossos, a fim de que se averigue a causa de sua morte – atribuída a um ataque cardíaco. O presidente deposto era, desde jovem, cardiopata, e isso facilitou a versão oficial para o óbito prematuro. Jango morreu aos 57 anos. Sobre o assunto tenho depoimentos a dar. O primeiro deles é sobre a personalidade serena de Jango. Conheci-o em seus primeiros meses como ministro do Trabalho, em visita a Belo Horizonte.

Como repórter, acompanhei-o em seus encontros com os líderes sindicais de Minas. Eu o veria várias vezes nos anos seguintes, antes de com ele conviver no exílio em Montevidéu. Jango foi fiel à memória de Vargas, a quem dedicava afeto de filho. Suas ideias eram as de Getulio. A ele devo manifestações fortes de solidariedade naqueles anos sombrios.

Quando Lacerda morreu, Tancredo Neves comentou comigo suas suspeitas. Era curioso que as três personalidades mais fortes da oposição ao regime militar, e que haviam estabelecido uma aliança para a recuperação republicana do Brasil, morressem uma depois da outra: Juscelino em agosto e Jango em dezembro de 1976, e Lacerda em maio do ano seguinte. “Se todos morreram por acaso, isso só pode ser proteção de Deus ou do Diabo aos militares.” Como já estivéssemos no processo conspiratório para a redemocratização do País, Tancredo abriu a camisa, mostrou a medalha que trazia no peito e disse contar com seus santos protetores, entre eles São Francisco de Assis.

Os inúmeros depoimentos conhecidos mostram que os Estados Unidos não hesitam em livrar-se de seus inimigos, reais ou imaginários, por todos os meios. Quando lhes convêm, contratam sicários para a tarefa sórdida, como fizeram, ainda no festejado governo Roosevelt, ao recrutar o sargento Somoza para matar Sandino e, em seguida, entregar-lhe o governo da Nicarágua. Da mesma forma atuaram, ao apoiar, ostensivamente, o general Pinochet a fim de dar o golpe, bombardear o Palácio de La Moneda e dar fim a Salvador Allende, presidente do Chile. Quando isso não é recomendável, ou não dispõem de assassinos confiáveis, usam seus próprios agentes. Eles o fazem no “interesse da pátria”.

Conhecer a verdade sobre a morte de Jango, se ainda é possível descobrir as provas de possível assassinato, 36 anos depois, é um direito de seus familiares, e, mais do que seu direito, direito da nação. Se isso ocorreu, provavelmente os responsáveis pelo assassinato ainda poderão ser localizados – e pagar pelo seu crime. Se forem agentes estrangeiros, só um vazamento nos revelará a agressão.

Mas o conhecimento do crime será advertência severa contra aqueles que, em nome da “ordem”, ou de qualquer outra ideia, pregam a supressão da liberdade e submissão dos povos ao terror do Estado ditatorial.

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Mídia e ditadura: A primeira morte de Jango

Mídia e ditadura: A primeira morte de Jango

22 de março de 2013

Globo_Jornal02041964Saul Leblon, via Carta Maior

O atestado de óbito do ex-presidente João Goulart que atribui sua morte, em 1976, a um ataque cardíaco pode ter a mesma consistência daquele que, durante décadas, afirmou que o jornalista Vladimir Herzog cometera suicídio, atirando-se de uma cadeira numa cela do Dops. As suspeitas, antigas, no caso de Jango ancoram-se em indícios, sendo o maior deles o mais óbvio. A desconfiança que lateja há pelo menos uma década, ainda não foi submetida à prova da autópsia, vetada pela ditadura na época.

Há outros sinais.

Um ex-espião uruguaio, Mário Neira Barreiro, denunciou o assassinato no passado. Barreiro não é propriamente um cidadão acima de qualquer suspeita. Mas ampara suas revelações em detalhes de quem, ao menos, conhecia minuciosamente a rotina de Jango.

A ditadura só permitiu o sepultamento do ex-presidente, em São Borja, a 40 metros do túmulo de Getulio Vargas, com féretro blindado. Ainda assim, na última hora, o então ministro do Exército, Sylvio Frota, da extrema-direita militar, tentou anular a autorização expedida pela cúpula do governo Geisel.

O caixão lacrado, conduzido num carro em alta velocidade, cruzou a fronteira de Uruguaiana a 120 quilômetros por hora, vindo de Mercedes, na Argentina, onde ficava a estância dos Goulart. Ladeava-o um aparato militar com ordens expressas de não permitir manifestações populares.

Inútil.

Quando chegou à cidade, a população em peso estava nas ruas e cercou o cortejo. O caixão foi conduzido à catedral e daí cruzou São Borja em marcha solene até o cemitério.

“Jango, Jango, Jango!” Gritos guardados no fundo do peito desafiaram a tensão de um enterro vigiado por tropas vindas de vários pontos do Estado. A obscuridade em torno desse episódio remete a questões de atualidade incontornável.

Uma parte das sombras que pairam sobre este e outros acontecimentos envolvendo a ditadura brasileira deve-se à ambiguidade de quem deveria liderar as investigações. As relações entre a mídia e ditadura no Brasil nunca foram pautadas pelo distanciamento crítico que rege o olhar do cronista sobre seu objeto.

A história, ressalve-se, não é feita em preto e branco. O cardeal Bergoglio que o diga. Diretores de redações que apoiaram o golpe, em diferentes momentos, estenderam a mão a perseguidos pelo regime militar. Importa, todavia, avaliar o papel das instituições.

A mídia, como instituição, foi – é – parte interessada no assalto ao poder que interrompeu um governo democrático, suspendeu as liberdades e garantias individuais e censurou a própria liberdade de expressão. Foi dela a iniciativa de convocar o medo e a mentira e alimentar o linchamento de reputações. O conjunto foi decisivo para levar uma parte da classe média a apoiar a ação golpista. E mesmo assim, apenas uma parte.

O acervo do Ibope, catalogado pelo Arquivo Edgard Leuenroth, da Unicamp, reúne pesquisas de opinião pública feitas às vésperas do golpe. Os dados, cuidadosamente ocultados pela mídia então, assumem seu real significado cotejados com a atuação do aparato midiático, ontem e hoje.

As enquetes levadas às ruas entre os dias 20 e 30 de março de 1964, quando a democracia já era tangida ao matadouro pelos que bradavam em sua defesa, mostram que:

a. 69% dos entrevistados avaliavam o governo Jango como ótimo (15%), bom (30%) e regular (24%). Apenas 15% o consideravam ruim ou péssimo, fazendo eco dos jornais.

b. 49,8% cogitavam votar em Jango, caso ele se candidatasse à reeleição, em 1965 (seu mandato expirava em janeiro de 1966); 41,8% rejeitavam essa opção.

c. 59% apoiavam as medidas anunciadas pelo presidente na famosa sexta-feira, 13 de março.

Em um comício que reuniu 150 mil pessoas na Central do Brasil (o País tinha 72 milhões de habitantes), Jango assinou, então, decretos que expropriavam as terras nas margens das rodovias para fins de reforma agrária, bem como nacionalizavam refinarias de petróleo.

As pesquisas sigilosas do Ibope formam apenas o arremate estatístico de um jornalismo que ocultou elementos da equação política, convocou, exortou, manipulou, incentivou e apoiou a derrubada violenta do Presidência da República, em 31 de março de 1964.

Não se deduza disso que a democracia brasileira espelhava a placidez de um lago suíço. Num certo sentido, vivia-se, como agora, o esgotamento de um ciclo e o difícil parto do seguinte. As reformas de base – a agrária, a urbana, a fiscal e a educacional – visavam destravar potencialidades e recursos de um sistema econômico exaurido. O impulso industrializante de Vargas, dos anos 30 a meados dos anos 50, e o do consumo, fomentado por Juscelino, mostravam claros sinais de esgotamento. Trincas marmorizavam todo tecido social e produtivo.

À vulnerabilidade externa decorrente da frágil capacidade exportadora, sobrepunha-se uma seca de crédito junto ao sistema financeiro internacional. O déficit público era ascendente; idem, a espiral preços/salários; o PIB anêmico e a inflação de 25% no trimestre pré-golpe completavam a encruzilhada de uma sociedade em transe.

O conjunto tinha como arremate a guerra fria, exacerbada na América Latina pela vitória da Revolução Cubana, que desde 1959 irradiava uma agenda alternativa de desenvolvimento. O efeito na vida cotidiana era enervante. Como o seria no Chile, nove anos depois; como o é hoje, em certa medida, na Venezuela do ex-presidente Chavez.

O mercado negro de produtos essenciais testava a paciência dos consumidores. Óleo, trigo, açúcar, carne faltavam ciclicamente nos grandes centros urbanos. Fruto, em parte, de uma escassez provocada pela sabotagem empresarial.

As reformas progressistas de Jango estavam longe de caracterizar o alvorecer comunista alardeado pelos jornais. Tratava-se de superar entraves e privilégios de uma máquina capitalista entrevada em suas próprias contradições. Jango pretendia associar a isso um salto de cidadania e justiça social, ampliando o acesso à educação e aos direitos no campo.

O que importa reter, como traço de atualidade inescapável, é o comportamento extremado do aparato midiático diante desse projeto. Convocada a democracia a discutir o passo seguinte da história brasileira, os centuriões da legalidade optaram pelo golpe. Deram ao escrutínio popular um atestado de incapacidade para formar os grandes consensos, indispensáveis à emergência de um novo ciclo de desenvolvimento.

Jango foi assassinado aí, pela primeira vez, 12 anos e oito meses antes de sua morte. Se o fizeram, de novo, em setembro de 1976, cabe averiguar de uma vez por todas. Mas, sobretudo, parece claro que o tema das relações entre mídia e ditadura não pode mais se restringir aos bastidores das comissões da verdade.

Não há revanchismo nessa agenda.

Pauta-a a necessidade de dotar a democracia das salvaguardas de memória, pluralidade e participação social, que a preservem de uma recaída da intolerância, como a de 1964, que subtraiu à sociedade a prerrogativa de decidir o seu próprio destino.

Os que derrubaram Jango festejaram seu feito em editoriais gordurosos de cinismo. O de O Globo, veiculado pela família Marinho, dois dias depois do golpe, expõe um ponto de vista que consagra um método. A julgar pela experiência recente, não se pode dizer que caiu em desuso.

Leia abaixo, o editorial de O Globo, de 2 de abril de 1964.

Ressurge a Democracia!

Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas, independentemente de vinculações políticas, simpatias ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas, que obedientes a seus chefes demonstraram a falta de visão dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições.

Como dizíamos, no editorial de anteontem, a legalidade não poderia ser a garantia da subversão, a escora dos agitadores, o anteparo da desordem. Em nome da legalidade, não seria legítimo admitir o assassínio das instituições, como se vinha fazendo, diante da Nação horrorizada.

Agora, o Congresso dará o remédio constitucional à situação existente, para que o País continue sua marcha em direção a seu grande destino, sem que os direitos individuais sejam afetados, sem que as liberdades públicas desapareçam, sem que o poder do Estado volte a ser usado em favor da desordem, da indisciplina e de tudo aquilo que nos estava a levar à anarquia e ao comunismo.

Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente, certos, enfim, de que todos os nossos problemas terão soluções, pois os negócios públicos não mais serão geridos com má-fé, demagogia e insensatez.

Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. Devemos felicitar-nos porque as Forças Armadas, fiéis ao dispositivo constitucional que as obriga a defender a Pátria e a garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem, não confundiram a sua relevante missão com a servil obediência ao Chefe de apenas um daqueles poderes, o Executivo.

As Forças Armadas, diz o Art. 176 da Carta Magna, “são instituições permanentes, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade do Presidente da República e dentro dos limites da lei.”

No momento em que o Sr. João Goulart ignorou a hierarquia e desprezou a disciplina de um dos ramos das Forças Armadas, a Marinha de Guerra, saiu dos limites da lei, perdendo, consequentemente, o direito a ser considerado como um símbolo da legalidade, assim como as condições indispensáveis à Chefia da Nação e ao Comando das corporações militares. Sua presença e suas palavras na reunião realizada no Automóvel Clube vincularam-no, definitivamente, aos adversários da democracia e da lei.

Atendendo aos anseios nacionais, de paz, tranquilidade e progresso, impossibilitados, nos últimos tempos, pela ação subversiva orientada pelo Palácio do Planalto, as Forças Armadas chamaram a si a tarefa de restaurar a Nação na integridade de seus direitos, livrando-os do amargo fim que lhe estava reservado pelos vermelhos que haviam envolvido o Executivo Federal.

Este não foi um movimento partidário. Dele participaram todos os setores conscientes da vida política brasileira, pois a ninguém escapava o significado das manobras presidenciais. Aliaram-se os mais ilustres líderes políticos, os mais respeitados Governadores, com o mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da democracia no Brasil que estava em jogo.

A esses líderes civis devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo. Mas, por isto que nacional, na mais ampla acepção da palavra, o movimento vitorioso não pertence a ninguém. É da Pátria, do Povo e do Regime. Não foi contra qualquer reivindicação popular, contra qualquer ideia que, enquadrada dentro dos princípios constitucionais, objetive o bem do povo e o progresso do País.

Se os banidos, para intrigarem os brasileiros com seus líderes e com os chefes militares, afirmarem o contrário, estarão mentindo, estarão, como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes devem dar ouvidos. Confiamos em que o Congresso votará, rapidamente, as medidas reclamadas para que se inicie no Brasil uma época de justiça e harmonia social. Mais uma vez, o povo brasileiro foi socorrido pela Providência Divina, que lhe permitiu superar a grave crise, sem maiores sofrimentos e luto. Sejamos dignos de tão grande favor.”

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