Ricardo Kotscho em 29/7/2020
Esse barulho todo em torno dos arquivos secretos da República da Lava-Jato tem os ingredientes necessários para acabar numa grande pizza.
Quem deve ter ficado feliz com as denúncias do procurador-geral Augusto Aras contra os “segredos” dos justiceiros de Curitiba foi certamente o ex-ministro Sérgio Moro, que estava em busca de uma boa onda para voltar a surfar na mídia, agora que virou político, já em campanha para 2022.
Nos últimos dias, Moro estava até mandando mensagens de condolências para famílias de vítimas da covid-19 que ele nem conhecia para alimentar suas redes sociais.
Moro foi rápido no gatilho ao responder a Aras no Twitter:
“Desconheço segredos ilícitos no âmbito da Lava-Jato. Ao contrário, a Operação sempre foi transparente e teve suas decisões confirmadas pelos tribunais de segunda instância e também pelas Cortes superiores, como STJ e STF”.
É verdade. Até as eleições de 2018, em que Bolsonaro virou presidente, e Moro seu ministro, todas as decisões da Lava-Jato de Curitiba eram prontamente confirmadas pelos tribunais superiores, sem maiores discussões.
Acontece que agora o STF está dividido ao meio entre os grupos “lavajatistas” e “garantistas”, e nada garante que o plenário referende a decisão monocrática do presidente Dias Toffoli, que mandou enviar a Brasília todo o material da forças-tarefas da Lava-Jato de Curitiba, São Paulo e Rio.
Em setembro, quem assume a presidência do STF é o ministro Luís Fux, um lavajatista juramentado, enquanto Toffoli está alinhado com os garantistas.
Aras descobriu que a Lava-Jato de Moro em Curitiba tinha informações, não compartilhadas com o Ministério Público Federal, de mais de 38 mil pessoas, um arquivo com 50 mil documentos e 350 terabytes, nove vezes mais do que o sistema todo do MPF em Brasília.
E daí?, como perguntaria Bolsonaro, a quem Aras quer agradar, atacando Moro, depois que o presidente e o ex-ministro viraram inimigos?
Até pelo tamanho da encrenca, vai levar alguns séculos até o MPF destrinchar todo esse material e chegar a alguma decisão.
Como a Lava-Jato ainda é muito popular, tudo indica que, quanto mais durar esse imbroglio, melhor será para a campanha de Moro, que agora ganhou um palanque.
Na sua campanha particular para conquistar a vaga do ministro Celso de Mello, que se aposenta em novembro, Aras vai precisar convencer apenas um eleitor: o presidente Bolsonaro, que o nomeou para a PGR.
Já Moro precisa transformar em milhões de votos, algo que nunca fez na vida, o prestígio popular que ganhou ao condenar e prender Lula, surfando na onda do antipetismo.
Antes disso, porém, o ex-juiz terá que enfrentar no STF a ação movida contra ele pela defesa de Lula por supostamente ter atuado com parcialidade no julgamento do ex-presidente no caso do tríplex do Guarujá.
O relator da ação, ministro Gilmar Mendes, já avisou que só colocará esse processo em pauta quando puder reunir presencialmente a 2ª Turma do Supremo.
O espólio da Lava-Jato, agora disputado por Aras e Moro, ainda ocupará o noticiário por um bom tempo, e poderá ser decisivo na definição do cenário para 2022.
Até descobrirem o que tem nos 350 terabytes da República da Lava-Jato vai levar um bom tempo.
Façam suas apostas. Eu aposto na pizza.
Vida que segue.
30 de julho de 2020 às 20:09
Se existisse Judiciário no Brasil, Moro e Dallagnoll estavam presos e destituídos dos cargos públicos.