Em países que levam a educação a sério, quem falseia o currículo não passa um dia nessa cadeira. No Brasil de Bolsonaro, até um Weintraub pode chegar lá.
Bernardo Mello Franco em 30/6/2020
Depois de se revelar um quase doutor, Carlos Alberto Decotelli arrisca virar um quase ministro. O novo titular da Educação deveria tomar posse hoje [30/6]. A cerimônia foi cancelada após a descoberta de que ele turbinou o próprio currículo.
O ministro foi anunciado na quinta-feira como uma escolha técnica. Em quatro dias, suas credenciais desabaram como peças de dominó. Ao contrário do que dizia, o professor não concluiu doutorado em Rosário, na Argentina. Tampouco fez pós-doutorado em Wuppertal, na Alemanha.
Para completar, surgiram indícios de que Decotelli cometeu plágio em sua dissertação de mestrado. A Fundação Getulio Vargas informou que vai investigar o caso, e o mestre prometeu “revisar” as passagens que copiou e colou no trabalho.
O professor não é o primeiro figurão do governo Bolsonaro a ostentar títulos imaginários. O ministro Ricardo Salles já inventou um mestrado em Yale, e a ministra Damares Alves fantasiou que era mestre em educação e direito constitucional no Brasil. No passado, a então presidenciável Dilma Rousseff também teve que remover dois diplomas do currículo.
Salles e Damares conseguiram se segurar, mas a situação de Decotelli é mais complicada que a deles. O histórico acadêmico era seu principal cartão de visitas, e ele foi escolhido para a pasta que supervisiona todo o ensino superior no país.
Além de desgastar a própria imagem, o professor criou um embaraço para seus padrinhos. Oficial da reserva da Marinha, Decotelli contou com o pistolão dos ministros militares. Ontem alguns generais já se penitenciavam pela indicação. A Abin também sai mal do episódio. Mais uma vez, ficou claro que o filtro para as nomeações do governo só funciona no papel.
Em países que levam a educação a sério, quem falseia o currículo não passa um dia nessa cadeira. No Brasil de Bolsonaro, até um Weintraub pode chegar lá. Por ora, o presidente deixou a posse em banho-maria. Diante dos antecessores, um ministro que mente ainda pode ser um mal menor.
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