Como FHC enganava os outros e a si próprio

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Luis Nassif, via Jornal GGN em 21/1/2016

Há um mês estou debruçado, na reta final de uma biografia que estou escrevendo.

Olhando os guardados, encontrei uma entrevista preciosa com o ex-ministro Antônio Dias Leite. Primeiro, deu um longo depoimento para meu livro. Depois, permitiu-se discorrer sobre o quadro político e sobre a maneira do PSDB e do DEM criar uma oposição consistente ao PT.

A entrevista foi em janeiro de 2007.

Dias Leite foi um dos mais interessantes homens públicos brasileiros. Assessorou San Tiago Dantas, quando ministro da Fazenda de Jango. Foi seu colega na Universidade do Brasil, futura Universidade Federal do Rio de Janeiro. Participou da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) e foi ministro dos governos militares. Foi também um dos idealizadores do maior projeto industrial brasileiro dos anos 1970, a Aracruz Celulose.

Na época escreveu um livro sobre a economia brasileira. Sua receita para o desenvolvimento:

“Tem de mostrar com simplicidade as ideias. As pessoas muito especializadas se aprofundam em um ponto só e perdem a visão geral. Esses economistas dessa geração de 40, 50 anos [basicamente os economistas do real] todos vêm com certezas absolutas. Ciência não é isso”.

Dias Leite trabalhou com Jorge Kafuri, da Ecotec, uma das primeiras consultorias brasileiras, precedendo a Consultec. Kafuri era admirador de Vilfredo Pareto, um dos grandes economistas do século 19, um dos primeiros a estudar o fenômeno da distribuição da riqueza. E gostava de repetir uma máxima de Pareto: “Uma teoria é boa até que se encontre uma outra explicação que explique melhor a realidade”.

“Principalmente”, enfatizava Dias Leite, “não se pode perder de vista a realidade. Um plano econômico só é bom quando é politicamente viável de fazer”.

Na época, em pleno pós-mensalão, Dias Leite analisava o quadro político com uma dúvida e uma certeza. A dúvida é se o governo Lula degringolaria ou não. A certeza é que seria muito difícil o outro lado se organizar.

“PSDB e PFL são bichos diferentes, o PMDB também. Se não fizerem coalizões em torno de programas, nada irá para frente”.

Sustentava que Fernando Henrique Cardoso fracassou no segundo governo por causa de compromissos assumidos. Quando se preparava para o segundo mandato, FHC encontrou-se em um evento com Dias Leite. O ex-ministro alertou-o sobre a necessidade de um plano mais organizado. Conversaram por uma hora. Aí pediu que fizesse por escrito.

“Faça por escrito e desenvolva mais suas ideias”.

Foi feito. Dias Leite mobilizou vários amigos, elaboraram um documento de mais de 20 páginas com conceitos de uma nova estratégia para o Brasil e foi até FHC. Chegando lá, o presidente ligou na sua frente para o ministro da Fazenda Pedro Malan e pediu que recebesse Dias Leite.

Dias já o conhecia. Tinha presidido a banca do concurso de Malan. Entregou o trabalho.

“Nunca mais ouvi falar desse papel, nem do Pedro, nem do FHC”.

A inação administrativa de FHC não tem paralelo na história moderna do país.

Episódio semelhante ocorreu em pleno “apagão”. Em determinado dia, recebo um telefone do então governador do Mato Grosso Dante de Oliveira.

“Quero te passar em primeira mão. Estive agora com o presidente Fernando Henrique e apresentei uma proposta para ele, para enfrentar a crise, que foi aceita”.

Conhecendo o estilo, perguntei se ele tinha certeza de que seria aceita.

“Total. Na minha frente ele ligou para o Armínio Fraga [então presidente do BC] e disse-lhe para estudar atentamente a proposta que ele enviaria mais tarde.

Conhecendo o estilo, ousei dar um conselho para Dante: “Espere algum tempo até ter certeza de que a proposta foi aceita, para não fazer papel de bobo”.

Três meses depois outro telefonema de Dante:

“Você tinha razão, mas agora foi”.

“Foi como”.

“Na minha frente ele ligou para o Armínio e deu-lhe um esporro por não ter obtido retorno da proposta”.

Ponderei mais uma vez: “Você tem certeza de que o Armínio estava no outro lado da linha?”

Era obviamente outro blefe de FHC.

Quando saiu, FHC leu uma biografia de Franklin Delano Roosevelt e vangloriava-se de uma semelhança com ele: o de falar A para os políticos e fazer B.

Foi a única semelhança. Do essencial – o New Deal de Roosevelt –, FHC não captou nada. Sempre foi um folgazão sem nenhum apego ao trabalho e, mesmo sendo de família de militares que ajudaram na construção da nacionalidade, nunca almejou nada mais do que o brilho fugaz instantâneo.

Os grandes estadistas até podiam usar o engodo como estratégia para atingir objetivos maiores. Para FHC era apenas o engodo pelo engodo, para reafirmar, para ele próprio, sua esperteza.

Leia também:
Coletânea de textos: FHC, o vendilhão da Pátria

2 Respostas to “Como FHC enganava os outros e a si próprio”

  1. jvpassos995420 Says:

    Sempre pensei em FHC, como um ser imundo, uma aberração imoral… Muito pior que os PTralhas, visto que estudou e adquiriu certa cultura… Ainda penso que, ao parafrasear Rosevelt,torna-se mais baixo ainda, um pústula, MENTIROSO… Mentiu durante o tempo todo em entrevista na BBC, quando o apresentador o espremeu até sair água dos olhos… Gaguejou o tempo todo… Canalha !!! Agora, publica um livro, mostrando suas safadezas quando foi um pseudo-presidente… Deveria sumir, ter vergonha nessa cara de pau enorme !!! Que pena que não temos no Brasil, matadores de ex e de presidentes !!! Pelo menos nisso, os americanos são melhores que nós !!! Punem com a morte, o erro de seus presidentes…

  2. Jésus Araújo Says:

    Diante de tal personalidade, não é de estranhar ter FHC confessado que sabia dos escândalos da Petrobrás e nada fez (FHC, Memórias da Presidência, nas livrarias). Além de ter tido o rolo compressor do Congresso impedindo CPIs e o PGR, apelidado Engavetador Geral da República, para garantir a imagem de seu governo. O de que FHC gostava mesmo era de viajar, para receber título de doutor honoris causa em universidades estrangeiras e fascinar exercitando seus dons de poliglota. FHC admitiu a uma jornalista que o entrevistava ser profundamente vaidoso; ora, os vaidosos, sabemos, são, geralmente, limitados em suas ações. Como cientista social-escritor, teve como as melhores obras as feitas em parceria, a quatro mãos (com o uruguaio Enzo Faleto, a mais badalada, com seu ex-mestre Florestan Fernandes, com Octavio Ianni, com um sociólogo brasileiro de nome alemão que não me acode…)

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