Daniel Guth, via A bicicleta na cidade em 23/9/15
Antes do Dia Mundial Sem Carro, a Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade) apresentou à sociedade os dados de uma inédita pesquisa sobre o perfil de quem usa bicicleta na cidade.
Mais de 1.800 questionários foram aplicados, compreendendo três recortes regionais (centro, intermediário e periferia); pontos com e sem infraestrutura e também locais de intermodalidade – notadamente bicicletários nas estações de trem, metrô e terminais de ônibus. A pesquisa e a metodologia foram realizadas conjuntamente com a ONG Transporte Ativo e com o Observatório das Metrópoles.
Os resultados surpreenderam pelo ineditismo, ou seja, por ter sido a primeira pesquisa com este nível de profundidade e interesse no perfil de quem usa bicicleta na cidade, mas também pelo conjunto de dados que rompem com alguns mitos e sensos comuns historicamente associados à cultura da bicicleta. Aqui elenco alguns deles:
“A bicicleta só é boa para curtas distâncias”
Na verdade, a bicicleta é um bom veículo TAMBÉM para curtas distâncias. A afirmação de que distâncias que superam 5 km não seriam indicadas para se fazer em bicicleta é não apenas falaciosa em si, como também revela um desejo íntimo de desqualificar e diminuir este importante meio de transporte na cidade.
“Mulheres pedalam menos e fazem distâncias mais curtas do que os homens”
Mais um mito (sexista) quebrado. Estatisticamente há pouquíssima – ou nenhuma – diferença na cultura do uso de bicicleta entre os gêneros. Seja no tempo de deslocamento, nas distâncias ou mesmo na frequência com que usa bicicleta como meio de transporte durante a semana. Veja os dados abaixo:
A diferença gritante que há, entre os gêneros, encontra-se no volume, na quantidade total de mulheres que de fato pedalam em São Paulo – dado sobre o qual a pesquisa de perfil não se debruça, por compreender somente as pessoas que já se utilizam da bicicleta como meio de transporte.
Pela média das contagens de ciclistas realizadas em diversos pontos da cidade, as mulheres representam apenas 6% do total – um dado gravíssimo, muito triste e que precisa ser melhor investigado por quem estuda a mobilidade urbana nas cidades.
“Ciclovias têm de servir como redes alimentadoras de estações de trem, metrô e terminais de ônibus”
Dentre os engenheiros de tráfego de visão mais rodoviarista, a ideia de que bicicletas são funcionais, como veículo, apenas para curtas distâncias, levou-os a um equivocado entendimento de que infraestrutura cicloviária só poderia ser planejada e implantada se atendesse à relação de intermodalidade da bicicleta com os meios de transporte de alta capacidade. Vejam a opinião do engenheiro de tráfego Luiz Fernando di Pierro, em uma reportagem do Jornal Nacional de março deste ano.
Evidentemente que há um contingente importante de pessoas que se utilizam dos bicicletários nas estações de trem, metrô e nos terminais de ônibus. Igualmente óbvio é o fato de que estas infraestruturas são fundamentais e devem ser ampliadas e melhoradas – especialmente nos bairros mais distantes do centro. No entanto a pesquisa traz dados que revelam uma característica muito interessante dos ciclistas paulistanos e que aponta para outro caminho de análise e compreensão da cultura deste meio de transporte: o exclusivismo nos deslocamentos.
Entre os ciclistas que usam bicicleta há mais de 5 anos e mesmo com quem o faz há menos de 1 ano, é predominante o desejo e a cultura de se utilizar da bicicleta como um veículo porta-a-porta, ou seja, de origem e destino exclusivamente em cima de uma bicicleta.
Verificando o gráfico das distâncias percorridas no principal deslocamento, segundo recorte geográfico, observamos que no recorte periferia o percentual de entrevistados que fazem distâncias superiores a 10 km é o mesmo do que aqueles que fazem distâncias entre 2 e 5 km.
“Ninguém usa essas ciclovias”
Quem passa dirigindo um carro, olha para o lado e não vê uma bicicleta passando em uma ciclovia, logo poderia pensar isto. Mas qual a relevância deste empirismo? Do ponto de vista técnico, nenhuma.
Primeiro porque as contagens de ciclistas já desmontam completamente este argumento. Cito aqui três casos:
Ciclovia da Av. Eliseu de Almeida, que liga Taboão da Serra com a região do Butantã. Antes da ciclovia passavam pouco mais do que 500 ciclistas nesta Avenida, durante o período de contagem (das 6h às 20h). Poucos meses após a inauguração da ciclovia, o número pulou para 1.245 ciclistas no mesmo período – ou 89 ciclistas por hora. Um aumento superior a 100%.
Ciclovia da Avenida Faria Lima, que está sendo estendida à Av. Pedroso de Moraes e à Av. Hélio Pellegrino, até o Parque Ibirapuera. O volume de ciclistas já impressiona, mesmo esta sendo uma ciclovia ainda em implantação plena. Em uma Avenida onde antes praticamente nenhum ciclista se aventurava hoje passam 1.941 pessoas em bicicletas, das 6h às 20h. São 139 ciclistas por hora, somente nesta ciclovia.
Ciclovia da Avenida Paulista. O volume de ciclistas na avenida desde a inauguração, em junho deste ano, já aumentou 116%, saltando de 977 para 2.112 ciclistas. São 150 ciclistas por hora, em média.
Portanto quem ainda insiste que não há ciclistas nas ciclovias ou é desonesto intelectualmente ou não consegue enxergar outras formas de deslocamento que não impactam tanto visual e ruidosamente quanto carros.
A pesquisa de perfil dos ciclistas apontou outro dado interessante: de todos os entrevistados nas regiões central e intermediária, 40% disseram pedalar há menos de 1 ano. Ou seja, a migração de modos de transporte está acontecendo de maneira bastante intensa, especialmente na região central – onde há maior oferta tanto de transporte público quanto de ciclovias e ciclofaixas.
Conclusão
Planejar e pensar a mobilidade urbana e sua diversidade de matizes e culturas hoje requer um olhar mais local e especializado. O conhecimento histórico e acumulado sobre planejamento e engenharia rodoviaristas não podem ser estendidos para traduzir a cultura urbana da bicicleta, menos ainda para formular e executar políticas públicas para este meio de transporte.
Para rompermos com os mitos e falácias que ainda assombram os debates acerca da mobilidade por bicicletas será preciso um comprometimento maior de todos os atores e atrizes da sociedade – do poder público à imprensa e às universidades, dos movimentos sociais à iniciativa privada.
Será preciso, antes de mais nada, reconhecer que a forma de olhar e interagir com a cidade, a partir da visão limitada do rodoviarismo carrocêntrico, não atende à diversidade de usos e culturas de quem se desloca e/ou poderia se deslocar de bicicleta na cidade.
Daniel Guth é consultor de políticas de mobilidade urbana.
Leia também:
● Em outras metrópoles Haddad seria um “visionário”, diz Wall Street Journal
● Pesquisa: 40% dos ciclistas de São Paulo começaram a pedalar há menos de um ano
● Com redução da velocidade, acidentes nas marginais Tietê e Pinheiros caem 36%
● Bikes mais que dobram com ciclovia na Avenida Paulista
● Mobilidade urbana: Pelo 2º ano seguido, bicicleta ganha Desafio Intermodal em São Paulo
● Prefeitura de São Paulo articula rede de serviços para atender refugiados
● A história da bicicleta em São Paulo
● O “paradoxo Haddad” ampliou velocidade nas Marginais
● Por que o trânsito melhora quando se diminui o limite de velocidade das avenidas?
● 82% gostariam de trocar carro por bicicleta ou caminhada, diz pesquisa
● Fernando Haddad critica judicialização de seu mandato
● Não foi na ciclovia: Como a lógica e a verdade foram atropeladas sob o Minhocão
● A guerra primitiva dos paulistanos contra a bicicleta e contra o progresso
● Após novos limites de velocidade, Marginais tem queda de 30% nos acidentes
● Fernando Haddad eleva piso e abre 3,5 mil vagas de professor
● Prefeitura de São Paulo fecha 2014 com investimento recorde, apesar de déficit
● Pesquisa faz uma radiografia sociopolítica do paulistano
● O fim da gestão Haddad
● Londres reduz limites para 32km/h em 25% das vias e mortes caem
● Haddad: “Quem não tem projeto usa a irracionalidade para interditar o debate.”
● Limites de velocidade nas ruas: Falácias, mitos e verdades
● Folha mente: Fernando Haddad desmascara matéria mentirosa
● Gestão Fernando Haddad fará em 4 anos o que o PSDB não fez em 20
● Fernando Haddad: “O monotrilho de Alckmin custou R$6 bilhões e está há um ano em testes.”
● A histeria patética em torno da redução da velocidade nas marginais de São Paulo
● Depois de ontem, São Paulo não será mais a mesma
● Ciclovia da Avenida Paulista é inaugurada
● Depoimento de quem foi na inauguração da ciclovia da Avenida Paulista
● Entrevista: Haddad expõe sua ousadia e as limitações que o cargo lhe impõe
● Ciclovias de Haddad são premiadas nos Estados Unidos
● Não vai dar na Globo: Domingo, dia 28 de junho, será inaugurada a ciclovia da Avenida Paulista
● “São Paulo tem hoje o prefeito que deveria ter tido há mais de uma década”, diz urbanista
● Haddad ironiza crítica de “coxinha” às ciclovias
● Prefeito Fernando Haddad e a virtude de governar sem mídia
● Programa Braços Abertos: “Antes dele, 9 em cada 10 viciados desistiam.”
● Fernando Haddad aperta o cerco à corrupção e ao enriquecimento ilícito
● Fernando Haddad: “A cidade de São Paulo é um desafio para qualquer político.”
● Crack, Fernando Haddad e o jornalismo da Folha de S.Paulo
● O dia em que Haddad deu uma aula para Sheherazade e Marco Antonio Villa
● Enquanto Alckmin some, Haddad faz o trabalho do governador
● Fernando Haddad: “Não aumentar a tarifa de ônibus seria demagogia, puro eleitoralismo.”
● Fernando Haddad fala sobre Marta, Chalita, a lógica do MPL e o “caipirismo” do PSDB
● O plano para as finanças da cidade de São Paulo
● Não é pelos cinquenta centavos: Haddad desmonta manifestação do Passe Livre
● Em 2015, Fernando Haddad voltará a dar aulas na USP
● Fernando Haddad eleva piso e abre 3,5 mil vagas de professor
● 2016 já começou em São Paulo e Haddad é o alvo
● Haddad: “PT está muito mais maduro do que em 2003.”
● Secretário de Educação de Haddad desmonta factoide da Folha
● Fernando Haddad e a derrota do cinismo
● O que não se fala sobre o IPTU da cidade de São Paulo
● A lógica inatacável do aumento do IPTU em São Paulo
● O falso escarcéu sobre IPTU
● Haddad diz que não vai tolerar “terrorismo do monopólio da comunicação”
● Prefeitura de São Paulo isenta 3,1 milhões de famílias de pagamento do IPTU
● Fernando Haddad já pode alçar voos mais altos
● Em rede social, Fernando Haddad critica policiamento na Cracolândia
● Fernando Haddad quer aumentar o salário de médicos e ampliar fiscalização das OSSs
● Como Fernando Haddad venceu a corrupção que outros não combateram em São Paulo?
● Para professor da USP, gestão de Fernando Haddad pode virar marco em São Paulo
● Em ato histórico, prefeito Haddad prioriza minorias no Programa Minha Casa, Minha Vida
● Haddad assina decreto para notificar imóveis que não cumprem função social
● Entrevista: Haddad, ano 2
● Bob Fernandes: Descoberto outro propinoduto da máfia dos fiscais de São Paulo
● MP investiga gestões de Serra e Kassab por desvio de R410 bilhões do IPTU
● Fernando Haddad: “A elite de São Paulo é míope e pobre de espírito.”
● Entrevista com Fernando Haddad: “A Prefeitura estava tomada por corrupção.”
● MP abre inquérito civil contra Kassab por receber fortuna da Controlar
● Kassab recebeu uma “verdadeira fortuna” da Controlar, diz testemunha da máfia do ISS
● Máfia demotucana: A lista dos corruptores do ISS
● Máfia demotucana: Planilha aponta que 410 empreendimentos pagaram propina a fiscais
● Receita do município de São Paulo sobre R$30 milhões com o fim da máfia dos fiscais
● Fernando Haddad: “A máfia não seria descoberta sem a ajuda de Donato.”
● Antônio Lassance: Arroubo tucano é pânico
● Máfia demotucana: Investigação de propina em São Paulo avança sobre a gestão Serra
● Máfia demotucana: Haddad desmente Folha sobre repasse de informações à Polícia Civil
● Paulo Moreira Leite: Cardoso, Donato e a fábula da classe dominante
● A máfia dos fiscais quer pegar Haddad
● Máfia demotucana: Secretário ligado a José Serra será convocado a depor em São Paulo
● “Não há como recuar, e não haverá recuo”, avisa prefeito Haddad
● Máfia demotucana: Como a mídia protege Serra e Kassab
● Máfia demotucana: Quadrilha zerou ISS de 107 prédios em São Paulo
● Máfia demotucana: Situação era de degradação, diz Haddad sobre a quadrilha do ISS
● MP/SP mira Kassab para livrar José Serra
● Máfia demotucana: A dama do achaque abre o jogo
● Máfia demotucana: “Arquiva”, manda Kassab
● Máfia demotucana: A Folha se considera só um papel pendurado na banca
● Máfia demotucana: Líder da quadrilha diz que Kassab sabia do esquema e esperava que ele “ganhasse a eleição”
● “O implacável braço direito de Serra” e o caso de corrupção em São Paulo
● Seus problemas acabaram: Filie-se ao PSDB
● Braço direito de José Serra mandou arquivar denúncias de pagamento de propina para construtoras
● Prefeito Haddad e a lição de ética
● Após investigações, Haddad manda prender ex-funcionários da gestão Kassab/Serra
● Há mais envolvidos no esquema de corrupção do governo Kassab/Serra, diz Haddad
● Só depois da posse de Haddad, a Veja percebeu que a cidade de São Paulo está um lixo
● Para atacar Haddad, “Estadão” usa foto da guerra do Congo para ilustrar matéria
● Desespero: Cabo eleitoral de Serra, Soninha xinga Haddad de “filho da p…” e diz que odeia o povo
Os comentários sem assinatura não serão publicados.