Nos ovos sujos de Yoani Sanchez, a afonia da dissidência cubana

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Depois do acordo, no final de 2014, o Twitter de Yoani Sanchez passou a falar de ovos sujos nos mercados em Havana. Suas críticas se reduziram a isso.

Mauricio Leandro, via Rede LatinAmérica em 6/6/2015

Há dois meses, quase em simultâneo com a realização da Cúpula das Américas do Panamá, a famosa blogueira cubana Yoani Sanchez esteve no Chile. Diferente de sua primeira visita ao sul da cordilheira, esta última teve pouquíssima transcendência midiática, mesmo os meios chilenos não deram mais que pequenas notas sobre sua passagem pelo país. Um episódio que relata com eloquência o afonismo da dissidência cubana com a diminuição paulatina de sua presença midiática.

Yoani Sanchez é um símbolo mundial do anticastrismo. Se destacou por seu afã de criticar o governo e denunciar perseguições contra si mesma, através dos blogs, Twitter e do espaço que ganhou em meios da grande imprensa latino-americana fora de Cuba.

Nos últimos dois meses, a que foi ídola de boa da SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa, que reúne os donos de jornais do continente, todos de direita) resignou sua vida jornalística a críticas cotidianas e a divulgação de notícias já conhecidas. Algumas de suas denúncias mais recentes são tão vazias como a de que “os ovos em Cuba estão chegando ao mercado mais sujos”.

Além disso, a interação de seus seguidores nas redes sociais tem sido visivelmente menos frequente, outro indicador dos novos tempos.

Mas a blogueira também falou sobre o acordo entre os dois países, e positivamente. Nos tópicos em que abordou o tema, ela valorizou os acordos alcançados até agora, assim como outras notícias de interesse internacional sobre Cuba: os profissionais de saúde cubanos enviados à África e ao Nepal, o aumento do turismo na Ilha durante o primeiro semestre de 2015, a reabertura do serviço de balsas entre a Flórida e Havana, a licença dada a um hospital nova-iorquino para realizar um protocolo clínico com a vacina cubana contra o câncer de pulmão, o jogo Cosmos contra a Seleção Cubana de futebol e a visita que o Papa Francisco fará em setembro.

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As Damas de Blanco, outrora protagonistas de grandes reportagens, hoje presentes em pequenas notas de canto de página. Em abril, uma das últimas publicadas.

As Damas de Blanco e a derrota eleitoral
Já as Damas de Blanco, grupo de oposição formado em 2003 e que durante anos viveu de pedir a liberdade de seus familiares – “presos políticos” segundo elas, e “delinquentes comuns” segundo a versão oficial –, é hoje uma das organizações mais críticas à normalização das relações entre Cuba e os Estados Unidos. Também é a que tem menos repercussão jornalística. Sua última aparição na imprensa foi em abril passado, e mesmo seu sítio web tem visto poucas atualizações. Antes disso, o grupo sofreu divisões internas surgidas após a libertação total dos “presos políticos” pelos quais elas lutavam.

Enquanto se produzia a “desaparição” midiática das Damas de Blanco, dois dissidentes cubanos, Hildebrando Chaviano e Yuniel Lopez, concorreram nas eleições municipais do país, em março, perderam e reconheceram sua derrota, anunciando que “a população não está preparada, ainda há muita ignorância”, segundo afirmou Chaviano.

Obama e a dissidência
Durante o último ano, os governos de Cuba e dos Estados Unidos mantiveram um diálogo discreto, cujos resultados só se conheceram há poucos meses, com gestos que propiciaram a retomada do diálogo entre as nações e o início de uma relação bilateral anulada desde o triunfo da Revolução Cubana, em 1959.

Na semana passada, um fato de grande importância marcou um passo a mais na relação entre os dois países: a exclusão de Cuba da lista de países patrocinadores do terrorismo, “lista negra” na que a nação caribenha esteve incluída desde 1982.

Durante a Cúpula das Américas, em abril passado, antes do histórico encontro com Raul Castro (o primeiro entre presidentes dos dois países em meio século), Barack Obama, se reuniu com um grupo de dissidentes que foram ao Panamá.

A oposição cubana vê a aproximação com receio e surgiram divisões. Alguns grupos consideram que os Estados Unidos os abandonaram politicamente. Para outros, a abertura é o caminho para um maior intercâmbio que mude o futuro político da Ilha.

Seja como for, essa mesma dissidência cubana, há menos de um ano atrás, enchia as páginas dos diários de todo o mundo, e hoje não aparece em nenhuma parte.

Tanto os cubanos quando o resto do mundo esperam com ansiedade os novos capítulos diplomáticos. Será preciso esperar que o fim do bloqueio seja discutido no Congresso estadunidense, única instância com poder de derrubar aquilo que vem encurralando economicamente a maior das antilhas, e impedindo sua normal relação comercial com o mercado internacional, desde 1960.

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Uma resposta to “Nos ovos sujos de Yoani Sanchez, a afonia da dissidência cubana”

  1. Jandyra Abranches Says:

    Será que é em solidariedade ao panfleto brasileiro que ela fala de ovos?

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