Terceirização: R$4,6 milhões é o preço do PL 4.330?

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A direita, que tanto denuncia o suposto aparelhamento do Estado por parte do PT, quer acabar com os concursos públicos e só utilizar trabalho terceirizado.

Rennan Martins, via Carta Maior em 9/4/2015

Liderados pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, a quem o experiente jornalista político Janio de Freitas descreveu como “cria de Paulo César Farias”, nossos deputados aprovaram por 324 votos favoráveis e 137 discordantes o texto base do Projeto de Lei 4.330/04, que regulamenta e amplia a possibilidade de terceirizações nas empresas.

Polêmico, o PL extingue a diferenciação entre atividade-meio e atividade-fim – o que abre precedente para a possibilidade de terceirizações ilimitadas e empresas sem empregados – estabelece que a responsabilidade da empresa contratante é subsidiária em relação a prestadora do serviço, e permite até mesmo a terceirização de cargos do serviço público, excetuando somente os setores de regulamentação e fiscalização. Trata-se do maior retrocesso aos trabalhadores desde a ditadura militar.

A retórica dos partidários do projeto de que é preciso especializar o mercado de trabalho e dar garantias aos mais de 12 milhões de terceirizados no país não resiste a análise dos dados. O texto prevê que no caso de calote patronal o trabalhador somente poderá recorrer a “empresa mãe” após esgotadas as possibilidades de receber da que o contratou, a dita responsabilidade subsidiária. Além do mais, no Brasil os terceirizados recebem em média 24,7% menos que os diretamente contratados, possuem jornada semanal 3 horas e meia maior e são os que mais sofrem acidentes de trabalho, o que derruba por terra a tese da especialização. A precarização dos terceirizados é tão evidente que entre os 10 maiores resgates de trabalhadores em condição análoga à escravidão realizados entre 2010 e 2013, em nada menos que 90% dos casos as vítimas eram terceirizadas.

A Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) tem verdadeiro horror a proposta. Em campanha de denúncia e combate ao projeto, o presidente da associação e juiz titular da 20ª Vara Trabalhista de Porto Alegre sustenta que a lei tem potencial de reduzir a participação do fator trabalho na renda dos atuais 34 a 37% para algo entre 25 a 30%, e diz que os efeitos seriam “catastróficos”.

Se tudo isso ainda não fosse suficiente, temos ainda escandalosa inconstitucionalidade no PL. O artigo 37 inciso II da Constituição Federal prevê que:

“A investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”.

Serão nossos parlamentares tão ignorantes, ou prepotentes, a ponto de afrontar a constituição munidos de um simples projeto de lei?

O mais intrigante desse quadro é o fato da direita tanto denunciar o suposto aparelhamento do Estado por parte do PT e ainda assim defender a terceirização dos cargos das empresas públicas e sociedades de economia mista, o que justamente as transformará em mero cabide eleitoral. É o velho patrimonialismo da elite de volta a ofensiva.

Os verdadeiros interessados no PL 4.330/04
Na terça-feira, dia 7/4, o PL foi pautado pelo presidente da Câmara e como não poderia ser diferente, diversos atos de repúdio ocorreram em 17 estados e no Distrito Federal. Em frente ao congresso juntaram-se cerca de 4 mil manifestantes (segundo a CUT, a PM estima 2,5 mil) no intuito de pressionar os parlamentares.

Diante da pressão, o altivo Eduardo Cunha tomou uma medida inusitada que escancara a quem ele serve com o PL 4.330. Os sindicalistas da CUT e CTB foram proibidos de adentrar a chamada “casa do povo”, enquanto representantes de entidades empresariais, principalmente da indústria, assistiam a plenária tranquilamente. A atitude foi tão absurda que em liminar que suspende a autoritária decisão o ministro do STF Marco Aurélio Mello considerou “inimaginável” o acontecido.

Os favoráveis a terceirização generalizada arrotam termos como eficiência e especialização mas pesquisa da própria Confederação Nacional da Indústria demonstra o óbvio, quando perguntados sobre a terceirização, 91% dos industriais a consideram em primeiro lugar uma boa alternativa para a redução dos custos.

Por fim chegamos ao que motivou a headline do artigo, o pequeno grande segredo do maior entusiasta do projeto. Em 2014 o atual presidente da Câmara Eduardo Cunha declarou arrecadação da ordem de R$6,8 milhões em doações para a campanha. Desse montante, R$4,6 milhões vieram principalmente da indústria de bebidas, mineradoras, bancos e da Telemont, interessadíssimos no assunto. Será esse o preço pago pela aprovação do PL 4.330? Ou as empresas acreditam no “compromisso com o bem público” de seus patrocinados?

Leia também:
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5 Respostas to “Terceirização: R$4,6 milhões é o preço do PL 4.330?”

  1. pintobasto Says:

    E daí, José J.G. de Araújo, o Povo trabalhador tem que partir para a GREVE GERAL pelo fim da PL 4330 e fazer outra exigência muito necessária ao Brasil, correr com Eduardo Cunha da cãmara dos deputados. Ele tem ficha suja, nunca podia ter sido candidato!

  2. Fernando Cardoso Says:

    Chegou o momento do povo brasileiro fechar esse maldito, inescrupuloso e principalmente imprestável Congresso Nacional,
    os seus componentes são atualmente os maiores inimigos dessa Nação.

  3. Giordano Says:

    Se o tal projeto vier a ser finalmente aprovado no Senado, o que acho provável, certamente chegará ao STF, por iniciativa de algumas Centrais Sindicais comprometidas verdadeiramente com os interesses da classe trabalhadora. Pena é que, se isso acontecer, provavelmente a relatoria cairá no colo do famigerado Gilmar Mendes. E aí, estamos cansados de saber o resultado.

  4. José Jésus Gomesde Araújo Says:

    E daí, sr. Pinto Bastos? A população está consciente disso? Deixará de votar nos candidatos do capital financeiro, do agronegócio/latifúndio? Se não se conseguir mudar o perfil ideológico do Congresso, cuidadosamente controlado pelos poderosos desde a queda do Estado Novo, nada podemos esperar de bom e esperar progressivamente o pior. Eles estão vencendo. Que futuro nos aguarda?

  5. pintobasto Says:

    Não é necessário ser um especialista em relações trabalhistas para saber que a terceirização de trabalhadores é uma fraude trabalhista. Um deputado que aprova uma PL desta natureza, é um indivíduo sem escrúpulos, um enganador que não pode continuar no congresso porque não representa o Povo.

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