Ditadura militar: Procurador-geral da República diz que tortura e morte são imprescritíveis

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Procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Roldão Arruda, via O Estado de S.Paulo

O novo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acaba de sinalizar importante mudança na interpretação da Lei da Anistia de 1979. Em manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal sobre a extradição de um ex-policial argentino, o ocupante do mais alto cargo do Ministério Público Federal observa que a anistia brasileira deve se submeter às convenções internacionais que tratam do assunto e das quais o Brasil é signatário.

De acordo com tais convenções, os chamados crimes contra a humanidade, como a tortura e a morte de opositores políticos, são imprescritíveis.

Isso significa que, ao contrário da interpretação em vigor no Brasil, militares e agentes policiais que violaram direitos humanos na ditadura, entre 1964 e 1985, não podem ser beneficiados pela Lei da Anistia.

É a primeira vez que o Ministério Público Federal se manifesta dessa maneira sobre a questão, estimulando abertamente a reabertura do debate sobre o julgamento no qual o Supremo, em 2010, definiu que a anistia teria beneficiado tanto os perseguidos políticos quanto seus perseguidores. Em sua manifestação, Janot até lembra a decisão do STF. Mas observa em seguida que “ainda não passou em julgado”.

De fato, ainda estão pendentes os embargos de declaração apresentados pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), autora do ação original, favorável à punição de agentes dos agentes do Estado.

A interpretação de Janot contradiz a de seu antecessor. Em 2010, ao se manifestar no julgamento do STF, Roberto Gurgel deu parecer contrário à ação da OAB. Na avaliação dele, a anistia teria resultado de um longo debate nacional, com o objetivo de viabilizar a transição entre o regime autoritário militar e o regime democrático, e abrangeu crimes “de qualquer natureza”.

Para Janot, a anistia a acusados de torturas não pode ser justificada em nome da transição para a democracia. Diz ele: “Na persecução de crimes contra a humanidade, em especial no contexto da passagem de um regime autoritário para a democracia constitucional, carece de sentido invocar o fundamento jurídico geral da prescrição”.

Divulgada na semana passada pelo MPF, a manifestação de Janot foi redigida no final de setembro. Trata-se de um parecer sobre o pedido de prisão preventiva, para fins de extradição, do ex-policial argentino Manuel Alfredo Montenegro.

Refúgio

Acusado de crimes de privação ilegítima de liberdade e tortura na ditadura militar da Argentina (1972 a 1977), o ex-policial se refugiou no Rio Grande do Sul, onde foi localizado.

O procurador-geral defendeu a prisão e a extradição do argentino. O eixo principal de sua argumentação foi o consenso nas cortes internacionais sobre imprescritibilidade de crimes contra a humanidade. Segundo Janot, trata-se de “norma imperativa do direito internacional, tanto de natureza principiológica quanto consuetudinária”. Essa norma, enfatiza e sublinha no seu texto, “também se aplica ao Brasil”.

Janot menciona de passagem que a Corte Interamericana de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário, endossou a tese jurídica da imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade – assim chamados por afetarem não apenas uma vítima direta, mas toda a humanidade, representada por um determinado grupo humano. Foi essa corte que, em 2010, condenou o Brasil no julgamento de uma ação apresentada por familiares de mortos e desaparecidos no Araguaia.

A sentença da Corte Interamericana determina expressamente que sejam apuradas as responsabilidades pelas chacinas ocorridas na guerrilha. Deixa claro que não aceita a ideia de que a anistia de 1979 teria beneficiado policiais e militares.

Mudança

A manifestação de Janot foi bem recebida por procuradores que atuam na área da chamada justiça de transição. Um deles lembrou ao Estado que Gurgel já havia dado um passo nessa direção, ao se manifestar favoravelmente à extradição de outros três argentinos, acusados em casos de sequestro e desaparecimento forçado de opositores políticos. Com essa atitude ele teria endossado a tese de que pessoas acusadas em casos assim não podem ser anistiadas, uma vez que os crimes não foram interrompidos.

A manifestação de Janot amplia o debate. Procurado pelo Estado, ele não quis se manifestar, afirmando que seus argumentos já estão expostos no texto enviado ao Supremo.

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Uma resposta to “Ditadura militar: Procurador-geral da República diz que tortura e morte são imprescritíveis”

  1. bene nadal Says:

    O Brasil conservador, ou seja aquele que durou até 2002, e especialmente o período da ditadura, (1964 a 1985), Se caracteriza por algumas peculiaridades como: em primeiro lugar assinar “atestado de vira latas”, valorizando mais o algoz EUA, do que o próprio Brasil, praticamente entreganodo o nosso país “de mão beijada”, trocando a industrialização do Brasil por “indústrias sucateadas dos EUA”, e completando com: “deixar as multinacionais fazerem aqui o que quisessem… Como na casa da mãe joana…
    Com relação a anistia, tão divulgada na época, pelos militares no poder, como se tivessem fazendo um grande favor aos perseguidos pelo regime… Praticamente o pais todo, “engambelado” pela mídia golpista, colocou o “rabinho entre as pernas”, como muitos estão até hoje. Preste atenção na conveniêcia da criação dessa anistia geral e irrestrita(?)… Para os incautos, os militares no poder estavam ficando “bonzinhos”, mas para quem tem alguns neurônios a mais em atividade, sabia e sabe o tempo todo que a tal anistia, promulgada em conluio com o Judiciário, tinha uma única intenção: livrar os torturadores e assassinos de qualquer julgamento, após eles devolverem o país a quem de direito, ou seja: aos brasileiros.
    Com relação aos perseguidos, aqueles que não incomodavam muito tiveram permissão para voltar ao país, e assim corroborar a idéia de “anistia ampla geral e irrestrita”, mas os que poderiam causar constrangimento aos ditadores e torturadores, tão logo voltaram ao país, quando não um pouquinho antes, ou um pouquinho depois, foram mortos no mínimo em situações estranhas…
    Até os dias de hoje ainda vemos pessoas cuja mente não está em seu melhor estado que defendem os ditadores, na maioria é claro, por interesses inconfessáveis… O grande mal disso é que influencia alguns jovens, que não tenha sido educado com valores reais, em relação á sociedade.
    É de extrema importância que o Brasil como um todo, faça um grande entendimento, entre todos os cidadãos que têm alguma formação de comunicação na sociedade, e elabore um código de mídia, que seja aplicado, a todos os órgãos de mídia com o máximo rigor, pois hoje mais do que nunca, as mídias de modo geral, e especialmente os grande grupos oligopolizados, fazem um incasável, contínuo e persistente trabalho de “lavagem cerebral, e especialmente os grandes grupos de mídia, incluso os da internet, são extremamente bem pagos para fazer esse trabalho sujo, que pode até preparar as pessoas para, de novo colocarem o “rabinho entre as pernas”, e aceitarem um novo golpe… Não podemos esquecer que o poder de fogo do 1% mais rico do Brasil e do mundo, são capazes de superar os 99%, só com trabalhos da mídia…

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